Documento do Ministério da Aeronáutica aponta pernambucanos que foram excluídos de instituições

A Comissão da Verdade de Pernambuco entrega hoje à Comissão de Alagoas, no Centro de Convenções, em Olinda, um documento inédito que reforça as práticas de perseguição do regime militar (1964-1985) às instituições de ensino no período. O texto é uma cópia de um documento do Ministério da Aeronáutica, de janeiro de 1976, contendo todos os atingidos pelo Decreto-lei n° 477, de 1969, que expulsou estudantes e professores de instituições de ensino. Em Pernambuco, 89 pessoas foram atingidas com a medida. A importância da lista é que, pela primeira vez, é encontrado um registro de um documento oficial reunindo todos os punidos pela medida do governo do presidente Artur da Costa e Silva (1899-1969).

Eneida Melo perdeu o direito de estudar. Documento inédito reforça prática. Foto: Cecília Sá Pereira/DP/D.A. Press

O Diario teve acesso, com exclusividade, ao documento sob a guarda do Arquivo Nacional, em Brasília. Nas 177 páginas da lista, 11 são dedicadas ao estado de Pernambuco. Nela, nomes como o atual vice-prefeito do Recife Luciano Siqueira (PCdoB), o vereador de Olinda Marcelo Santa Cruz (PT), o advogado e membro da Comissão Nacional da Verdade José Paulo Cavalcanti Filho e a desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 6ª Região Eneida Melo. “São nomes que hoje fazem parte, com destaque, da sociedade pernambucana”, comentou o membro da Comissão da Verdade e conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Henrique Mariano.

Um fato curioso no registro das Forças Armadas é que dos 89 citados na lista, 67 têm o processo anexado com fotos. Alguns dos militantes, por exemplo, aparecem nos registros visivelmente com marcas no rosto. “Isso demonstra como a ditadura atuava, em todos os setores sistematicamente”, reforçou Mariano.

Veja o documento

Excluída do sistema

A desembargadora do TRT da 6ª Região Eneida Melo foi uma das estudantes da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) que perdeu o direito de estudar com o Decreto-lei nº 477, em fevereiro de 1969. “Na época, eu não pertencia a nenhum partido político, como nunca pertenci. Eu apenas questionava através de manifestações na faculdade o fato do nosso país não ter um regime democrático”. Com a expulsão da universidade, Eneida, que hoje também é professora do curso do qual foi expulsa um dia, começou a trabalhar como secretária na Arno Indústria e Comércio.

“A gente não podia dizer que foi alvo do decreto. Se dissesse, não lia nem um livro na biblioteca e as empresas não contratavam”, comenta. Eneida voltou ao curso em 1972, três anos depois. “Entrei com um requerimento e tive o direito de voltar. Não sofri perseguições durante o período em que fiquei afastada da universidade. Notava que era vigiada antes da expulsão”. A desembargadora comenta que preferiu não entrar com o pedido de reparação financeira na Comissão de Anistia. “A vida me deu a maior reparação ao ver o meu país voltar ao regime democrático”.

Da mesma turma de Eneida, o vereador de Olinda Marcelo Santa Cruz (PT) também teve suspenso o direito de frequentar o curso. O petista conta que ele e mais dois colegas da sala foram estudar em Portugal depois do episódio.

 

 

Fonte – Diário de Pernambuco

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