Com “investigações tímidas”, Comissão da Verdade quer apertar ritmo
Três meses depois de sua instalação, a Comissão Nacional da Verdade enfrenta dificuldades para avançar nas investigações sobre crimes da ditadura. Convive ao mesmo tempo com a resistência das Forças Armadas em fornecer informações, as críticas dos parentes das vítimas do regime e as dificuldades para conciliar as agendas de seus membros. A comissão está terminando a etapa de montagem de sua estrutura e pretende aprovar seu primeiro cronograma de trabalho na reunião de segunda-feira.– Estamos nos encaixando agora e o trabalho deve acelerar de modo geral. O cronograma não poderá funcionar como uma camisa de força, eu estou em dedicação exclusiva e nem sou remunerado, mas é uma dádiva reconstruir essa história agora – afirmou Cláudio Fonteles, membro da comissão e subprocurador aposentado.
Os membros da comissão recebem salário de R$ 11.179 mensais. Claudio Fontelles, Gilson Dipp e José Paulo Cavalcanti abriram mão de seus vencimentos pelo trabalho na comissão.
Fonteles contou que desde julho, antes da criação das subcomissões que dividiram os trabalhos, formou uma equipe de seis pessoas (entre comissionados e assessores) para pesquisa no Arquivo Nacional. De acordo com ele, a equipe tem encontros diários para dividir informações. Até o momento foram colhidos oficialmente apenas dois depoimentos: o do ex-delegado da repressão Claudio Guerra e o do legista Harry Shibata, que colaborava com os militares em São Paulo.
– Até agora, as investigações estão tímidas, o que não quer dizer que não se tenha crescido no processo. Fizemos planejamento, avaliação de atuação e distribuição de tarefas – disse o assessor da comissão e ex-secretário-geral da presidência do STF, Manoel Lauro Volkmer de Castilho.
Em julho, o advogado José Carlos Dias avisou aos colegas de comissão que iria se ausentar em algumas ocasiões no julgamento do mensalão. Ele é advogado de Vinícius Samarane, do Banco Rural. O afastamento está de acordo com a lei que respeita a atividade profissional dos integrantes. Outro membro da comissão, Paulo Sérgio Pinheiro, preside a Comissão Internacional de Investigação para a Síria, da ONU.
As investigações contam com os sete membros, além de 10 assessores – ainda este mês, serão 14. Os salários dos assessores variam de R$ 4 mil a R$ 8 mil. O grupo contará também com o auxílio de servidores administrativos da Presidência, que serão solicitados.
A apuração das mortes e desaparecimentos enfrenta resistência das Forças Armadas. Após a posse, o grupo solicitou informações ao Ministério da Defesa e foi informado que os documentos estariam destruídos. Para Fonteles, a destruição foi ilegal e nova consulta foi feita sobre os documentos e as circunstâncias da suposta destruição. Até agora a comissão segue sem resposta.
Crimeia Almeida, presidente da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, teme pelas limitações de tempo para o trabalho:
-Se são 24 meses, desanima um pouco saber que três foram para se organizar – reclamou.
Ivan Seixas, do Núcleo de Preservação da Memória Política, discorda:
– Não é que esteja parado, acho que está sendo estruturado. A comissão foi montada de maneira abrupta.
Fonte – O Globo