Comissão da Verdade acusa 11 agentes da ditadura por cinco mortes

O coordenador da Comissão da Verdade, Claudio Fonteles, divulgou ontem textos que acusam 11 agentes do Estado, militares e civis, pela morte sob tortura de cinco militantes de esquerda durante a ditadura militar (1964-1985).

Foto do prontuário de Carlos Marighella

Com base numa análise feita por três peritos da Polícia Civil de Brasília que colaboram com a comissão, Fonteles também afirmou que o guerrilheiro Carlos Marighella (1911-1969) foi morto sem esboçar reação ou tentar pegar sua arma, ao contrário da versão oficial.

Ex-militantes ‘descobrem’ repercussão de filme sobre tortura 41 anos depois

Ele atribuiu a responsabilidade pela morte ao general Milton Tavares (1917-1981), ex-chefe do CIE (Centro de Informações do Exército): “De tudo, resta claro que Marighella foi eliminado por agentes públicos do Estado, sob a supervisão do general Milton”.

Fonteles divulgou ontem, no site da comissão, 11 textos sobre episódios diversos da ditadura. É a primeira vez que a comissão torna públicos textos produzidos por algum de seus integrantes. Para Fonteles, a intenção é “abrir amplo espaço de diálogo, visando enriquecer essa pesquisa inicial com sugestões e críticas”.

Os principais documentos citados por Fonteles já foram objeto de reportagens jornalísticas, estudos acadêmicos e livros. Mas, com seus textos, ele antecipa conclusões que a comissão poderá vir a adotar quando de seu término, previsto para 2014.

Ele afirmou que o metalúrgico Manoel Fiel Filho (1927-1976), o militante da ALN (Ação Libertadora Nacional) Joaquim Câmara Ferreira (1913-1970), o padre Antônio Henrique Pereira da Silva Neto (1940-1969), o engenheiro Raul Amaro Nin Ferreira (1944-1971) e o sargento da Aeronáutica João Lucas Alves (1935-1969) morreram sob tortura por agentes do Estado.

Fonteles apontou que agentes e médicos legistas encobriram a morte de Aldo de Sá Brito Souza Neto (1951-1971), da ALN. Documento citado por Fonteles diz que quando a família foi reclamar o corpo, militares afirmaram que Aldo estava vivo, e mostraram o corpo de outra pessoa. Queriam ganhar tempo para achar outros militantes.

Fonteles disse ainda que houve obstrução do Ministério da Justiça na apuração da morte do padre Silva Neto.

O coordenador da Comissão da Verdade, Claudio Fonteles

ARMAMENTOS

Em outro texto, Fonteles relacionou a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) à produção de armas para o grupo de militares que derrubou o presidente João Goulart, em 1964. Fonteles citou relatório confidencial produzido pelo SNI (Serviço Nacional de Informações), hoje sob guarda do Arquivo Nacional, que descreve a criação do GPMI (Grupo Permanente de Mobilização Industrial) no dia 31 de março de 64, data do golpe militar.

Tal órgão, segundo o documento, teve a função de “fornecimento de armas e equipamentos militares aos revolucionários paulistas”.

Procurada pela Folha, a Fiesp não havia se manifestado sobre o texto até a noite de ontem.

Fonteles apontou: “Portanto, a Fiesp na data mesma da eclosão do golpe militar, que em nosso país redundou no Estado ditatorial-militar, celebrou ‘a primeira tentativa de união industrial-militar’, sob o fundamento de que ‘não é possível existir qualquer poderio militar sem uma indústria que faça esse poderio'”.

A tese não é inédita e foi abordada em estudos acadêmicos sobre as relações entre os militares golpistas e setores da sociedade civil.

Um total de 75 documentos produzidos pelo GPMI está hoje sob guarda da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo.

 

Fonte – Folha de S.Paulo

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *