Responsável por intermediar a relação entre a Comissão da Verdade e as Forças Armadas, o Ministério da Defesa informou que “apenas quatro pedidos de informações aguardam resposta dos comandos militares”.
Segundo a pasta, de um total de 30 requisições, 26 já foram respondidas, sendo que 12 foram enviadas com a apresentação de documentos.
“O Ministério da Defesa não faz juízo sobre as respostas que envia à Comissão da Verdade. Procura simplesmente cumprir seu papel institucional, e cooperar em tudo o que pode para atender os pedidos que lhe são formulados”, disse, em nota.
A Marinha, por sua vez, informou que é rigorosa no “cumprimento das leis e dos regulamentos”, e que “continuará contribuindo com as tarefas do Ministério Público Federal, da Comissão Nacional da Verdade, ou de outro órgão do Estado com competência em realizar diligências sobre quaisquer temas de interesse da sociedade, colocando-se à inteira disposição para o atendimento de qualquer demanda que esteja ao seu alcance”.
A Força ressalta que os documentos que tinha sobre a ditadura foram encaminhados ao Arquivo Nacional.
A Aeronáutica informou que “tem contribuído com a Comissão da Verdade e outros órgãos governamentais para o cumprimento de suas atividades”.
Já o Exército, também procurado, não respondeu.
Investigações sobre a ditadura são travadas pelas Forças Armadas
As Forças Armadas têm se recusado a responder dezenas de ofícios da Comissão Nacional da Verdade e do Ministério Público Federal travando a investigação de crimes da ditadura (1964-85).
Desde que foi criada, em maio de 2012, a comissão não recebeu nenhuma informação relevante do Exército, Marinha ou Aeronáutica, segundo levantamento feito a pedido da Folha.
Oficialmente, o discurso é outro: o Ministério da Defesa e as três Forças afirmam que estão colaborando.
A comissão requereu a relação de oficiais que serviram em órgãos da repressão, questionando ainda quais foram as bases militares utilizadas. Não houve resposta.
De um pedido de informação sobre 60 militares, somente a Marinha respondeu, apresentando o nome de dois. Nenhum dado foi obtido de um outro requerimento que cobrava dados sobre 309 casos de torturas, mortes e desaparecimentos.
Procuradores responsáveis pelas investigações dos crimes do período dizem o mesmo: a falta de colaboração atrapalha o andamento de inquéritos abertos em diversos Estados com o objetivo de questionar a validade da Lei da Anistia em casos de desaparecimento forçado.
Cinquenta anos após o golpe, Exército, Marinha e Aeronáutica chegam até a enviar aos seus superiores hierárquicos, como a Defesa e a Presidência da República, informações comprovadamente falsas.
Embora sejam dos órgãos federais os que mais respondem aos pedidos da Lei de Acesso à Informação (índice superior a 95%, de acordo com a Controladoria Geral da União), as três Forças adotam tática protocolar de apresentar informações superficiais ou incompletas.
Segundo um ex-ministro da Defesa do governo Lula, as Forças Armadas se especializaram em repassar “informações minimalistas”, sem se comprometer.
A preocupação é de que a abertura dos arquivos possa incriminar militares pela tortura ou morte de opositores.
“Essa prática demonstra um claro compromisso institucional com as graves violações da época”, diz Pedro Dallari, coordenador da Comissão Nacional da Verdade.
O boicote dos militares também prejudica o trabalho do Ministério Público Federal. “Quando pedimos informações, o tratamento costuma ser cordial, mas os resultados são mínimos”, conta o procurador Marlon Weichert.
No Rio, procuradores que investigam casos como o atentado do Riocentro esbarram no mesmo boicote. O Exército tem se negado a prestar informações básicas como a ficha funcional de oficiais e o controle de entrada dos quarteis.
Em São Paulo, num outro inquérito, o Exército informou não ter qualquer registro funcional de oficiais reformados que recebem aposentadoria. “Como a Força pode pagar um benefício a alguém que não conhece? É um disparate”, reage Weichert.
Fonte – Jornal Floripa