O tenente-coronel da Aeronáutica Alfeu de Alcântara Monteiro, assassinado na Base Aérea de Canoas (RS) no dia 4 de abril de 1964, foi homenageado ontem (7) pela Comissão da Verdade de São Paulo Rubens Paiva. De acordo com a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), o oficial foi morto por arma de fogo ao resistir à prisão determinada pelo seu posicionamento contrário ao golpe militar de 1964. A contestação de militares ao regime e a perseguição que sofreram das Forças Armadas foi o tema da audiência.
A homenagem incluiu a exibição de uma reportagem relembrando a trajetória do militar. Segundo o acervo da CEMDP, ele participou na linha de frente do movimento pela legalidade, liderada pelo governador gaúcho Leonel Brizola e pelo comandante do 3º Exército, general Machado Lopes, em Porto Alegre. O grupo resistiu à intervenção militar que tentou impedir a posse do vice-presidente João Goulart, após a renúncia de Jânio Quadros, em setembro de 1961. Alfeu foi um dos responsáveis por impedir que caças decolassem da Base Aérea de Canoas para bombardear o Palácio Piratini, sede da resistência legalista, desobedecendo ordens superiores.
Durante a audiência, prestaram depoimentos os capitães Simão Keremian, Francisco Fernandes Maia, José Araújo Nóbrega e Moacir Correia, que foram perseguidos pela ditadura. O consultor da Comissão Nacional da Verdade (CNV), Paulo Cunha, que coordenou os trabalhos na Assembleia Legislativa de São Paulo, destacou a importância desses testemunhos para recuperar a verdade histórica do período militar. “Já temos contabilizados 27 militares que foram mortos no período pós-1964 e dez outros civis de origem militar que também foram dizimados”, destacou.
O capitão da reserva do Exército José Araújo Nóbrega relatou o período em que integrou o Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR) e depois a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), ao lado do capitão do Exército Carlos Lamarca, um dos líderes da oposição armada. Ele relembrou o momento em que se instalou com um grupo no Vale do Ribeira, em São Paulo. Segundo ele, o grupo não lutava para implantar o comunismo. “Éramos todos jovens interessados em acabar e mudar esse regime no Brasil, mas existia também a discussão sobre reformas sociais”, declarou.
O grupo passou a ser perseguido no Vale do Ribeira e, após se perder dos outros companheiros, Nóbrega foi preso e torturado. Por divergências políticas com o movimento, ele decidiu deixar a VPR e pedir asilo ao Chile. Enquanto estava lá, no entanto, foi novamente torturado após a deposição de Salvador Allende e instalação da ditadura do general Augusto Pinochet, em 1973. No episódio em que foi preso pela polícia chilena, ele pulou de um barranco para fugir e ficou pendurado em uma árvore. “Os carabineiros chegaram na borda, fizeram mais disparos, um que acertou o meu pé, outro a minha camiseta”, relembrou.
O capitão Simão Keremian, que atualmente preside a Associação Nacional dos Civis e Militares Aposentados e da Reserva (Acimar), destacou que nunca pertenceu a nenhuma organização política da época e que atuação dele estava identificada “com os militares legalistas em defesa das instituições democráticas”. Ele foi cassado em novembro de 1964. “Minha culpa foi ser fiel às autoridades legais constituídas”, avaliou. Keremian defendeu a revisão da Lei da Anistia. “[Esse período] transformou jovens oficiais em torturadores e assassinos, deixando-nos um passado vergonhoso de crimes imprescritíveis”, avaliou.
O sargento da Aeronáutica Francisco Fernandes Maia também foi expulso das Forças Armadas e teve os direitos políticos suspensos em 1967. Ele contou que assumiu uma postura crítica em relação às condições a que os sargentos eram submetidos, como não ter direito ao voto, não poder tirar o brevê para se tornar aviador e não poder casar durante cinco anos. “Antes disso, fui preso em 1965, acusado de pertencer ao Partido Revolucionário Trotskista. Impetrei quatro habeas corpus, mas só consegui sair nove meses depois”, apontou.
Fonte – Jornal do Brasil