Morte foi forma utilizada pela Ditadura para coibir atitudes de Dom Hélder. Relatório esclarecendo o caso foi apresentado nesta terça.
Comissão explica conclusões sobre o caso/(Foto: Vitor Tavares/G1)Após exatos 45 anos do assassinato do Padre Antônio Henrique Pereira Neto, o crime foi oficialmente esclarecido pela Comissão da Verdade de Pernambuco, nesta terça-feira. Como conclusão da investigação, a morte do padre foi considerada um crime político, contrariando as várias versões oficiais defendidas na época, de que teria sido um homicídio comum, até relacionado a drogas ou passional. Os detalhes foram apresentados no relatório do Volume 2 do Caderno da Memória e Verdade da Comissão, em cerimônia realizada na Capela São José dos Manguinhos, na Zona Norte do Recife.
O Padre Antônio Henrique foi assassinado na manhã do dia 27 de maio de 1969. Seu corpo foi encontrado com marcas de tortura e execução, em um terreno baldio, na Cidade Universitária, Zona Oeste do Recife. De acordo com documento apresentado nesta terça, a morte foi uma forma utilizada por membros da ditadura militar para coibir as atitudes libertadoras de Dom Hélder Câmara, então arcebispo de Olinda e Recife. Padre Henrique foi assessor de Dom Hélder e trabalhou na Pastoral da Juventude. Os detalhes foram revelados por Henrique Mariano, secretário-geral e relator do caso, e Fernando Coelho, coordenador-geral da comissão.
De acordo com Coelho, com a finalização do relatório, a Comissão da Verdade cumpre o compromisso assumido desde sua criação, em 2012. Esse é o primeiro caso finalizado, de 51, pela Comissão estadual. “Nao é uma versão nova, na verdade é apenas a confirmação daquilo que os que participavam de alguma atividade de Dom Helder e Padre Henrique sabiam. O governo na época, nao obstante tudo que fez pra preservar sua imagem, apresentou versão que apenas atingia seus interesses, até certo ponto, tentando apagar a memória do Padre Henrique. Depois do trabalho desenvolvido, juntamos arquivos e depoimentos e confirmados a versão denunciada desde o início”, disse.
O inquérito do caso do assassinato de Padre Henrique foi arquivado e reaberto várias vezes, desde 1969, mas nunca foi concluído. As investigações reiniciadas pela Comissão da Verdade apontam a participação de membros da Secretaria de Segurança Pública de Pernambuco na morte do Padre. A irmã do religioso, Isaíras Padovan, que participou da cerimônia, também contou que a família agora expõe para toda a sociedade tudo aquilo que já era sabido.
Poucos dias após o homicídio, a família de Padre Henrique recebeu uma visita de membros do governo, que ofereceram dinheiro para plantar documentos que prejudicariam Dom Hélder Câmara. “Isso foi basicamente o atestado de culpa deles. Eu lembro de tudo, naquela noite chuvosa e meu irmão não voltou para casa; sabia que algo de ruim tinha acontecido, que foi confirmado com a visita de Dom Hélder”, comentou Isaíras.
Arquivos foram reunidos e depoimentos, confirmados/Foto: Vitor Tavares/G1)Henrique Mariano leu o relatório produzido pela comissão, que fala que “não há dúvidas sobre a participação de agentes do governo de Pernambuco na morte do Padre Henrique”. Foi relembrada ainda a participação do Ministério da Justiça para interferir na conclusão do inquérito, já que a repercussão internacional do caso seria muito grande. Na época, Dom Hélder era conhecido pela defesa das liberdades na Ditadura Militar e chegou a ser indicado ao Nobel da Paz, em 1970. “O assassinato foi uma forma de tentar impedir os avanços da Igreja Católica fazia em Pernambuco em prol da liberdade durante o regime militiar. A cúpula da igreja no estado, incluindo o Padre Henrique e Dom Hélder, lutava contra o que ocorria naquela época”, destacou Mariano
Também presente na cerimônia, o prefeito do Recife, Geraldo Julio, anunciou a construção de busto de Padre Henrique, no Largo do Parnamirim, onde ele foi visto pela última vez com vida. Uma assessoria da Comissão da Verdade ainda será criada dentro da prefeitura, para auxiliar os trabalhos das comissões nacional e estadual.
Comissão Justiça e Paz
Nesta terça, o arcebispo metropolitano Dom Fernando Saburido anunciou reinstalação da Comissão de Justiça e Paz,instituída por Dom Helder em 03 de março de 1968. O grupo defendia de presos políticos e perseguidos pela ditadura militar. Na nova comissão, o presidente será o bispo emérito de Palmares, Dom Genival Saraiva de França, que também assumiu a função de vigário geral da Arquidiocese.
Fonte – G1