Seis vítimas da ditadura militar depõem em Feira de Santana

“A Câmara de Vereadores do Município de Feira de Santana, Estado da Bahia, considerando a comunicação feita a esta Casa pelas Forças Armadas, por intermédio do Comando das tropas do Exército aqui sediadas, resolve: Art. único – É declarado impedido, no cargo de Prefeito do Município de Feira de Santana, o Bel. Francisco José Pinto dos Santos”.

Esta é a Resolução 46/A, de 8 de maio de 1964, assinada por apenas três vereadores, que destituiu Chico Pinto, após  a Câmara de Vereadores não ter aprovado por duas vezes o “impeachment” do prefeito, mesmo depois da pressão militar. A Resolução foi lida na terceira audiência do Grupo de Trabalho da Comissão Estadual da Verdade (CEV) em Feira de Santana,  realizada nesta terça-feira (10), no auditório da UEFS, onde foram ouvidas seis pessoas vítimas da ditadura militar.

Falando para uma plateia composta por alunos e professores da UEFS, ex-militantes e outros representantes da comunidade lembraram mortes, torturas e sofrimentos nas famílias durante o regime militar. A audiência contou com a presença do coordenador do Grupo de Trabalho da CEV, Sinval Galeão, e da professora Amabília Almeida, representando a Comissão Estadual da Verdade. O GT já ouviu 16 pessoas até agora.

DEPOIMENTOS

José Virgínio dos Santos, que atuava no setor de Agitação e Propaganda do Partido Comunista Brasileiro e distribuía o jornal “Voz Operária”, ficou cinco dias preso em Salvador, onde recebia várias ameaças, tipo “vamos lhe jogar no mar”. Respondeu  a processo e foi absolvido em maio de 1975.

O segundo depoimento foi da professora Neuza Behrmann Estrela, viúva do professor José Coutinho Estrela, denunciado como “subversivo” por promover Feira de Conhecimentos no Colégio Estadual de Feira de Santana, além de discutir com os alunos problemas de educação. Foi preso em abril de 1969 e solto em dezembro de 1971. Ficou detido na Casa de Detenção, em Salvador, e depois na Penitenciária Lemos Brito, onde ficou junto a criminosos de alta periculosidade.

O Grupo de Trabalho ouviu também o economista e advogado Paulo Soares da Silva, que atuava pelo PCB no movimento estudantil, foi preso em 1969 e recolhido ao 35º Batalhão de Infantaria, em Feira, onde revela ter sofrido muita tortura psicológica de um tenente e um sargento.

O jornalista Wilson Mário Pinheiro Silva falou sobre o pai, o tabelião Walter Livramento Silva, já falecido, que de 1964 a 65 dirigiu o jornal “Gazeta do Povo”, ligado ao PCB e “empastelado” duas vezes pelos militares. Sofrendo rigorosa censura, o jornal publicava a imagem de Senhora Santana no lugar de cada reportagem proibida. Ele leu o documento de destituição de Chico Pinto, preso em casa em 2 de maio de 1964.

Maria Natalice Brito, filha do sapateiro Torquato Brito, deu um emocionado depoimento sobre o pai, que criou a Sociedade dos Sapateiros – profissional muito requisitado na época – e foi preso em 1964, quando os militares destruíram a sede da entidade.

Edvaldo de Oliveira Rios e José Álvaro França Rios falaram sobre o pai, José Martins Rios, que atuou em movimentos comunitários, principalmente no bairro Rua Nova, onde se fazia um trabalho de alfabetização pelo Método Paulo Freire. Choraram ao relatar as torturas sofridas pelo pai, preso em 1964 e submetido a muitas torturas.

COMISSÃO DA VERDADE

A Comissão Estadual da Verdade (CEV) na Bahia foi criada em dezembro de 2012, por meio do decreto estadual 14.227, com o objetivo de apurar e esclarecer violações aos direitos humanos cometidas por agentes públicos entre os anos de 1946 e 1988, principalmente as violações ocorridas durante a ditadura militar, de 1964 a 1985.

A CEV tem dois anos para apresentar um relatório que permita à sociedade baiana conhecer detalhes dos casos de opressão e violação aos direitos humanos ocorridos no Estado ou com baianos fora do Estado.

 

 

Fonte – Tribuna da Bahia

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