Jornalistas relatam cotidiano durante o regime militar

A imprensa foi um dos principais alvos da ditadura militar (1964-1985). Neste período, jornais deixaram de noticiar fatos importantes, repórteres perderam o direito e de ir e vir, além de sofrerem uma perseguição sistemática das Forças Armadas. A Comissão da Verdade de Pernambuco ouviu, na manhã desta quinta-feira (17), jornalistas que trabalharam na imprensa recifense no período, como Antônio Portela, Carlos Garcia, Ivanildo Sampaio, Juracy Andrade e Nagib Jorge. Os profissionais de imprensa relataram ao colegiado, pela primeira vez, a relação entre mídia e o poder no período.

Esta parte da história da comunicação é recheada de mecanismos entendidos por estes profissionais, longe dos arquivos oficiais. Por exemplo, não existem documentos que comprovem a interferência das Forças Armadas em publicações, pelo menos diretamente. O jornalista Nagib Jorge, que trabalhou nos jornais do Brasil e O Globo no Recife relatou, por exemplo, que os agentes abordavam os repórteres e diziam que determinado texto não deveriam ser publicados. “Uma vez um homem disse que era agente da polícia federal e não se identificou. Disse que era e pronto. Mandou a matéria não ser publicada. Muitas vez mandavam bilhetes, mas não documentos oficiais”.

O atual diretor de redação do Jornal do Commercio, o jornalista Ivanildo Sampaio, lembrou que, durante sua primeira fase no veículo, na década de 1960, não era permitido fazer matérias com polêmicas com o bispo dom Fragoso, que foi titular da Diocese de Crateús, no Ceará, por 34 anos. “Havia recomendação para evitar estas matérias. Também não podíamos realizar matérias positivas com o arcebispo de Olinda e Recife, d. Helder Camara”, disse o jornalista, lembrando que a repercussão das matérias dos jornais da região Nordeste, na época, era mais fortes por conta da força da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).

Até as emissoras e rádios públicas foram perseguidas pelas Forças Armadas. O jornalista Juracy Andrade lembrou que no ano do golpe de 1964 trabalhava na Rádio Universitária, pertencente à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). “Eu tive muita sorte. Trabalhava na rádio com Paulo Freire, então professor da universidade, em programas educativos. Eles esqueceram inicialmente da gente, só lembrando em agosto, tempos depois do golpe em abril”, comentou. “Nossa saída se deve a Gilberto Freyre, que respeito como literato, que pressionou a universidade, defendia uma devassa contra os comunistas na UFPE”.

A Comissão da Verdade de Pernambuco, no entanto, revelou que nenhum dos depoimentos coletados serve para solucionar casos de crimes, perseguição ou desaparecimento de presos políticos no estado. O colegiado relevou que a sessão pública realizada na Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), no bairro de Casa Forte, na Zona Norte do Recife, teve fins “culturais”. Os depoimentos estarão, futuramente, expostos e disponíveis no futuro memorial do colegiado a ser instalado na capital.

 

 

Fonte – Diário de Pernambuco

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