A Comissão da Verdade ouviu na tarde desta quinta-feira (31) o ex-juiz da 2ª auditoria da Justiça Militar Federal de São Paulo. Nelson da Silva Machado Guimaraes atuou durante a ditadura militar (1964-1985) e confirmou a existência de torturas nos porões do Doi-Codi (Destacamento de Operações de Defesa Interna), bem como no DOPS (Departamento de Ordem Política e Social).
Embora a informação não seja novidade, Guimarães disse que apesar da situação, à época, a auditoria da Justiça Militar era independente do regime, e que dentre as denúncias de tortura que lhe chegaram ao conhecimento, algumas foram encaminhadas à instância superior para que fossem investigadas. Guimarães disse que as que não foram registradas diziam respeito a guerrilheiros políticos treinados no exterior.
“Todos sabem que havia tortura como há tortura hoje no Brasil. Na guerra, se mata e se tortura dos dois lados”, declarou.
Durante a audiência, foi projetado no telão dois vídeos com depoimento de testemunhas que lançaram dúvidas sobre a atuação dele, no período. A advogada Eny Moreira falou que apesar de ter levado um de seus clientes ao juiz, relatando torturas no Doi-Codi, ele não acreditou no preso político e nem registrou a informação para averiguação. Já Lucas Scavoni, também em vídeo, afirmou ter visto Guimarães nas dependências do Doi-Codi quando lá estava para depor. Embora não tenha provas, Scavoni afirma considerar que o juiz ouviu seu depoimento ao agente da repressão.
Guimarães negou ter estado lá e menos ainda ter ouvido o depoimento. Por outro lado, Guimarães confirmou que esteve por algumas vezes no DOPS, inclusive praticando tiros em um stand da polícia Militar. Sobre a política do regime, que fazia desaparecer com corpos e ocultava cadáveres, o juiz disse que teve conhecimento de apenas um caso, mas que os guerrilheiros utilizavam nomes e documentos falsos, e que por isso eram sepultados com os dados que a polícia e o Exercito tinham, à época. A advogada Rosa Cardoso contra argumentou que mesmo tendo os nomes, militares falsificavam documentos e enterravam como indigentes. Para Guimarães, “os militares estavam na guerra, e quem está perto do fogo, reage de maneira compreensível à situação.”
Como autoridade da lei, naquele período, Guimarães falou que “tomava as providências cabíveis quanto a tortura.” Questionado por Cardoso se teria provas quanto a isso (tomar as providências cabíveis), o ex-juiz disse não precisar, a não ser que estivesse sendo julgado. Disse isso para tipificar que a Comissão da Verdade foi estabelecida para levantar fatos históricos, apenas.
“As penas que eu dei, julgava dentro do que me parecia adequado [à época, durante a Ditadura]”, falou.
A advogada Cardoso disse para o ex-juiz que o depoimento dele à Comissão era contraditório, e que ele não tinha independência quando exerceu o cargo. Ele rebateu dizendo que era um direito dela considerar aquilo, mas queria ve-la atuar numa Comissão da Verdade em um país como a China comunista, além de outros. O objetivo dele com esta afirmação foi dar a entender que os militares foram cruciais para que se implantasse a democracia no Brasil. Para Guimarães, havia sim, naquele período, uma guerra revolucionária instalada no país. A afirmação foi dita ao ler uma carta em que contextualizava a época, sob sua ótica. Para os que se opunham à atuação de Guimarães, como a advogada Eny Moreira, que estava presente na sala, ele foi um “juiz que prevaricou durante o exercício da função.” Já para o próprio Guimarães, “foi uma honra servir à Justiça Militar.” Ele agradeceu a Deus pelos acertos e pediu perdão (a Deus) pelos erros.
Fonte – Bem Paraná