Embraer e Docas são acusadas de perseguir trabalhadores na ditadura militar

A Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer) foi acusada, nesta segunda-feira (2), de perseguições políticas e demissões durante o regime militar, principalmente durante e depois das greves lá ocorridas na década de 80, e o presidente da empresa na época, coronel Ozires Silva, confirmou que “seguia ordens do regime”, durante audiência na Comissão Estadual da Verdade, da Assembleia Legislativa de São Paulo.

Confrontado com documentos encaminhados pela Embraer ao Ministério da Aeronáutica com nomes de empregados que faziam parte do movimento sindical e grevista na empresa, Ozires Silva, que, em 1983, autorizou os militares entrar na empresa para reprimir a greve, declarou: “Era uma empresa de propriedade da Aeronáutica e, portanto, havia uma ligação muito forte e nós cumpríamos as determinações que vinham [de lá]”. Ele disse, porém, não saber como a Aeronáutica tinha acesso a informações sobre os trabalhadores da empresa na época.

De sua criação, em 1969, até 1986, a Embraer foi presidida pelo engenheiro, coronel e ex-ministro Ozires Silva e, em dezembro de 1994, foi privatizada durante o governo Fernando Henrique Cardozo. Na audiência, antigos trabalhadores da empresa relataram perseguições políticas e demissões, como nas greves de 1983 e 1984, por reivindicar melhores condições de trabalho e redução da jornada. Como represália, muitos foram presos, fichados e interrogados sob acusação de terrorismo. Eles acusam a empresa, também, de ter mantido uma lista com nomes dos grevistas e que era repassada a outras empresas, impedindo-os de conseguir empregos na região.

“Fui interrogado por um capitão da Aeronáutica e demitido [após a greve]”, contou Getúlio Guedes, ex-empregado da Embraer. Após a demissão, ele procurou emprego em outras empresas, sem sucesso. Na época, o recrutador de uma grande empresa lhe disse para tentar vaga nas pequenas, porque, nas grandes, não conseguiria: “A Embraer mandou aqui uma lista de nomes, e você está nela. Procure emprego em pequenas empresas, ou não vai conseguir”. Em 2012, por causa dessas perseguições, 125 ex-funcionários da empresa foram anistiados pelo Estado e receberam indenizações trabalhistas.

Na saída da audiência, em entrevista a jornalistas, Ozires Silva disse que não havia nada que ele, embora presidente da empresa, pudesse fazer na época para evitar a colaboração da Embraer com o regime. “Na realidade, nunca foi minha vocação, como presidente da Embraer, questionar o regime sob o qual eu vivia. Inclusive, o governo era proprietário da minha companhia e, evidentemente, se eu brigasse com o dono da companhia, eu cairia fora. A Embraer era uma empresa de propriedade do governo. Brigue com o seu presidente [disse ele, virando-se para a repórter da Agência Brasil] e diga que não concorda com ele. Ele simplesmente vai colocá-la na rua”, afirmou Silva.

Outra empresa que teve sua atuação na ditadura militar lembrada hoje pela Comissão da Verdade foi a Companhia Docas de Santos, empresa privada, que em 1980, após o término do período legal de concessão da exploração do Porto de Santos, transformou-se na Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp). Empresa de economia mista, a Codesp hoje é vinculada à Secretaria de Portos da Presidência da República. Funcionários da companhia disseram ter sido perseguidos e demitidos após greves na empresa e relataram a presença de militares no local de trabalho na época.

“Temos vários casos de trabalhadores que foram punidos, não com demissão, mas que sofreram uma sorte de perseguições. Há trabalhadores, por exemplo, que levaram 20 dias de suspensão”, disse Antonio Fernandes Neto. Ele escreveu um livro sobre a história dos trabalhadores de Santos durante a ditadura, Nem os Pombos Apareceram no Cais, que será lançado no próximo dia 17. Um dos pedidos feitos por trabalhadores, durante a audiência, foi para que a Docas abrisse seus documentos referentes à ditadura militar. O pedido deverá ser encaminhado pela Comissão Estadual da Verdade à empresa.

Rodrigo Octavio Franco Morgero, do Departamento Jurídico, que representou a Docas durante a audiência, disse que esse tema era desconhecido pela direção. “Desconhecemos, em caráter oficial, a presença de qualquer órgão de repressão dentro da companhia”, afirmou Morgero. Sobre o pedido dos trabalhadores, de abertura dos arquivos, Morgero não soube dizer se poderá ser atendido pela empresa, mas garantiu que será analisado.

 

 

Fonte – Diário de Pernambuco

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