Nota oficial da Comissão de Anistia sobre Lamarca

A anistia a Carlos Lamarca, seus dois filhos e sua esposa constitui-se em ato oficial do Estado brasileiro, após rigoroso processo administrativo que também levou em conta decisões judiciais, está integralmente amparada pelo art. 8º do ADCT da Constituição da Republica de 1988 e pela sua regulamentação na Lei n. 10.559/02.

O Direito brasileiro prevê o direito à reparação à todos aqueles que foram atingidos por atos de exceção, na plena abrangência do termo, compreendidos como restrições ao exercício de direitos fundamentais por força do arbítrio autoritário do Estado ditatorial.

A história factual é notoriamente conhecida em torno dos atos de exceção sofridos pela família Lamarca: perseguições políticas sistemáticas, compelimento à clandestinidade, limitação ao direito de identidade, privação de liberdades públicas, difamação e constrangimentos públicos, desrespeito ao direito de resistência contra a opressão, obstáculos sucessivos ao direito a um projeto de vida sem impedimentos por praticas de abuso de poder ou atos institucionais de arbítrio, entre outros.

Por esse motivo, a Comissão de Anistia expressa sua contrariedade e grave preocupação com a judicialização do direito à anistia e à reparação integral (moral, simbólica e econômica). A decisão proferida no caso em concreto coloca em risco o esforço de reconciliação e o progressivo tratamento construído ao largo de 30 anos, por parte dos sucessivos governos democráticos, dos legados autoritários da ditadura militar e das demais questões ainda pendentes da transição democrática.

Neste contexto, qualquer “relativização” do direito à reparação e do direito à anistia ampla, geral e irrestrita para os perseguidos políticos e seus familiares, fere o princípio basilar da responsabilidade do Estado de Direito em indenizar a terceiros prejuízos que ele deu causa e também a compreensão legal da anistia como ato político que se exaure com a decisão do Estado expressa em portaria ministerial.

Solidarizamo-nos por mais esta atribulação impingida à família anistiada e em virtude da importância histórica do caso, a Comissão de Anistia reitera seu agradecimento à AGU que tem realizado com zelo as defesas judiciais das legítimas decisões do Estado brasileiro e que, mais uma vez, saberá recorrer tempestivamente da referida decisão junto às instâncias superiores do Poder Judiciário.

Para que não se esqueça. Para que nunca mais aconteça.

Fonte – Paulo Abrao – Presidente da Comissão de Anistia

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