MP entrou com pedido para que bloco não pudesse desfilar por suposta apologia à ditadura militar e a torturadores. Evento para divulgar grupo no Facebook fala em ‘opressão’ e ‘marchinhas opressoras’.
A juíza Daniela Pazzeto Meneghine Conceição da 39ª Vara Cível negou pedido de liminar do Ministério Público de São Paulo e permitiu que o bloco Porão do DOPS 2018 saia nas ruas no carnaval paulistano.
O MP tentava impedir que o bloco faça eventual apologia à tortura com nome que homeageia agentes públicos do período da ditadura militar. Evento criado no Facebook para a anunciar o bloco informa que grupo terá “cerveja, opressão, carne, opressão, marchinhas opressoras”.
O desfile do bloco está marcado para o dia 10 das 14h às 20h, sábado de carnaval, em local “a ser definido” e entrada a R$ 10. “Se você é anticomunista, não pode perder! Venham à caça, soldados!”, diz a descrição do evento.
‘Apologia’
Na ação do MP contra os criadores do bloco, os promotores Eduardo Valério e Beatriz Fonseca sustentam que os organizadores fazem apologia a tortura e que só poderiam sair se não usassem o nome e deixassem o tema. Entre os homenageados pelo bloco estão o Coronel Ustra e do Delegado Sérgio Fleury.
A juíza Daniela Conceição citou vários autores e a Constituição Federal para negar o pedido de liminar do MP. “Com efeito, com o advento da Constituição Federal de 1988, o legislador constituinte consagrou no artigo 5º diversos direitos e garantias individuais e coletivos, dentre eles, a liberdade de expressão e de manifestação de pensamento”, diz a juíza ao negar o pedido.
“Da mesma forma, o dispositivo contido no artigo 220 tutela a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, vedando qualquer limitação prévia, no tocante à censura de natureza política, ideológica e artística”, completa.
Stefanny Papaiano, coordenadora do bloco, informou que a decisão mostra que há juízes no país que julgam “dentro da realidade nacional, em vez de criminalizar apenas um lado”. “Existe uma necessidade de contextualização [do período da ditadura] na Guerra Fria”.
Stefanny também informou que o grupo nunca fez e nem fará apologia à tortura e que não sairá nas ruas no carnaval, mas em local privado. “A gente reconhece que houve uma repressão, mas a gente não reconhece a ditadura. A gente culpa os grupos de guerrilha da época por terem praticado terrorismo”, disse.
‘Censura prévia’
A juíza disse ainda que, se concedesse a liminar seria censura prévia. “A utilização da censura prévia como meio de coibir a manifestação de pensamento não se coaduna com o Estado Democrático de Direito”.
“O Poder Judiciário não tem, em regra, esse poder censório prévio de limitar e de suprimir o direito fundamental da liberdade de expressão e da liberdade de pensamento, conforme busca o MP”, afirmou a juíza na decisão.
Ela afirmou, ainda, que a medida afrontaria a harmonia entre os Poderes. “A se permitir que o Judiciário se arrogue num poder que não tem, seria afrontar a harmonização dos poderes e também seria violar a razoabilidade e proporcionalidade buscada a fim de se equilibrar direitos fundamentais, para que eles convivam harmonicamente”.
A juíza também informou na decisão que só poderia dar a liminar se o bloco fizesse divulgação nazista, e que na cidade existe um bloco soviético. “Ademais, em relação a fatos históricos o ordenamento jurídico somente autoriza a prévia censura e de forma expressa, a atos vinculados à divulgação do nazismo (Lei n° 7.716/88)”.
“No mais, a apresentação do bloco se dará nos dias de carnaval, em que a manifestação popular se dá por meio de atividades artísticas em que comumente são baseadas em fatos históricos do Brasil e do Mundo, tal como vem ocorrendo nos últimos cinco anos com apresentação do “Bloco Soviético”, mesmo porque muitas vezes as manifestações assumem até caráter jocoso e até crítico do período a que se visa retratar”.
Fonte – G1