Para historiadores ouvidos pelo R7, clima de instabilidade e radicalização no país levaram Forças Armadas para o centro da luta política
Na avaliação do historiador Marco Antonio Villa, em 1964, o que houve no Brasil foi um golpe militar que vem de uma tradição no país desde a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889.
Ele lembra as revoltas tenentistas da década de 1920, que desgastaram a República Velha e levaram Getúlio Vargas ao poder. O professor destaca a atuação dos militares em 1937, com o Estado Novo, e em 1955, com a posse de Juscelino Kubitschek.
Em 1964, de acordo com a análise de Marco Antonio Villa, o Brasil era um país dividido entre as propostas da direita e da esquerda e vivia uma crise econômica.
O clima de instabilidade vinha desde 1961 com a renúncia de Jânio Quadros. “Não havia, na época, apenas um projeto de golpe. Jango tinha planos de uma nova Constituição que permitisse a reeleição. Os partidos de esquerda pretendiam conquistar o poder com projeto de luta armada. Com o clima de radicalização, a direita, que não conseguia conviver com uma democracia de massa, usou então de uma estratégia histórica e levou as Forças Armadas para a luta política, que teve como resultado o golpe militar. Por isso, essa infeliz tradição não pode ser chamada de revolução”, diz o historiador.
Quem também descarta o termo revolução é o professor do Departamento de História da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo Luiz Antonio Dias. “Via de regra se pensa em revolução quando se tem participação popular e mudanças sociais. O que você tem em 64 não é uma coisa nem outra. Algumas pesquisas do Ibope que não foram divulgadas na época mostram que, dependendo do extrato social, a popularidade de João Goulart chegava a 70%, de forma geral a população apoiava as reformas de base”, afirma o historiador.
No Estado de São Paulo, porém, Jango tinha seus piores índices. A Marcha da Família, em 19 de março, realizada também em várias cidades como resposta à ameaça comunista, foi inquestionável, com muitos integrantes das camadas médias da sociedade.
“Quando você olha as propostas de Jango, elas causam incômodo entre empresários, latifundiários e a classe média, que também achava que iria perder direitos”, explica Luiz Antonio Dias. O professor lembra ainda o fato de João Goulart ser da linha do PTB de Getúlio Vargas, que não era bem vindo em São Paulo.
Para o historiador, o que houve a partir do clima de instabilidade no país e, consequentemente o golpe, foi uma construção de narrativa feita pela direita e os principais jornais, com exceção da Última Hora, para se criar a ideia de revolução ou contra-revolução necessário para evitar o comunismo no país. “O que caracterizaria um golpe: você ter uma instituição forte, que é o Exército que destituiu um presidente legítimo, mais que do Michel Temer, por exemplo, porque na época votava para vice-presidente. Há em seguida uma mudança na Constituição para dar legalidade a esse golpe e se constrói um discurso para dar legitimidade”.
Luiz Antonio Dias explica também que alguns historiadores usam para o 1964 o conceito de “golpe bonapartista”, quando a burguesia temerosa de perder o controle político abre mão do poder para que uma instituição poderosa, no caso o Exército, assuma o controle para manter os privilégios dessa elite.
Fonte – R7