Dois ex-diretores da Ford foram condenados nesta terça-feira a 12 e 10 anos de prisão respectivamente por cumplicidade na perseguição de representantes sindicais durante a ditadura argentina (1976-1983).
Após um ano de processo, um tribunal argentino condenou Héctor Sibilla, ex-diretor de segurança da Ford, a 12 anos de prisão e Pedro Muller, ex-gerente de manufatura, a 10 anos.
Ambos foram sentenciados por ser “participantes na privação ilegal da liberdade, agravada pelo uso de violência e ameaças, tormentos agravados por serem as vítimas perseguidas políticas”.
No caso de Sibilla, ela também presenciou uma sessão de tortura.
Os dois estão atualmente em prisão domiciliar, mas quando suas condenações forem definitivas, terão que cumpri-las na prisão, aponta a decisão recebida com aplausos e gritos de sobreviventes e parentes.
Na mesma sentença, o ex-general Santiago Riveros foi condenado a 15 anos de prisão por dirigir o centro de detenção clandestino Campo de Mayo, ao norte de Buenos Aires e perto da sede da fábrica.
O militar, que cumpre pena por outras condenações por violações de direitos humanos durante a ditadura, foi considerado co-autor de invasão ilegal de domicícilo e privação ilegal de liberdade.
“Se não tivesse sido pela vontade e o apoio do povo, não teríamos chegado até aqui. Mas a questão dos direitos humanos está bem inserida (na Argentina), já não é algo que se discute”, declarou à AFP Pedro Troaini, uma das vítimas, antes de entrar na sala de audiências.
“Só quero falar da minha vida pessoa. Cheguei ao país em dezembro de 1949 e encontrei trabalho como mecânico automotor e assim paguei meus estudos. Desde então nunca parei de trabalhar. Me dei conta que tinha que trabalhar de maneira apolítica. Tenho a consciência tranquila porque jamais fui acusado por minha conduta”, declarou Muller, o único que falou nesta terça-feira perante o tribunal.
A Promotoria havia solicitado penas de 25 anos de prisão, a máxima prevista para os crimes de privação ilegal de liberdade e tormentos.
“Esperamos um veredicto de responsabilidade, para que fique claro que houve cumplicidade empresarial com a ditadura. É muito importante para a história da Argentina”, declarou à AFP Tomás Ojea, advogado das vítimas, antes do veredicto.
Esta é a primeira vez que ex-diretores de uma multinacional são julgados na Argentina por crimes vinculados à ditadura.
“A vitória é de ter chegado até aqui, ter feito com que este julgamento acontecesse e feito com os trabalhadores apresentassem uma denúncia conjunta”, afirmou à AFP Elizabeth Gómez Alcorta, advogada das vítimas.
Ao longo do ano, apenas Muller compareceu ao tribunal durante a etapa das alegações, mas sem pronunciar uma palavra.
Em 1976, quando aconteceu o golpe de Estado que derrubou a presidente María Estela Martínez de Perón, a fábrica da Ford tinha quase 5.000 operários e 2.500 funcionários administrativos.
A fábrica tinha 100 representantes sindicais e 24 deles foram levados para cativeiro, muitas vezes no próprio local de trabalho e com listas elaboradas pela empresa, em represália por seu ativismo sindical, de acordo com a Promotoria.
Vários deles foram torturados na fábrica, na localidade de General Pacheco, na periferia norte de Buenos Aires, antes da transferência para centros clandestinos de detenção, segundo os depoimentos das vítimas.
Todos sobreviveram à ditadura, mas após mais de 40 anos apenas 13 representantes sindicais seguem vivos.
O ex-gerente de relações trabalhistas Guillermo Galarraga chegou a ser processado, mas morreu em 2016 sem que o julgamento tivesse começado. Nicolás Courad, ex-presidente da Ford na Argentina, morreu em 1989, muito antes de qualquer processo judicial.
O julgamento se limita a determinar a responsabilidade dos acusados e não envolve a empresa.
Fonte – EM