Depoimento do ex-delegado, que atuou como advogado da família do religioso, durou quase quatro horas
O delegado aposentado Jorge Tasso de Souza, que atuou como assistente da acusação – ao lado do irmão Fernando Tasso, já falecido – contra os envolvidos no assassinato do padre Antônio Henrique Pereira, reafirmou nesta terça-feira (31), em depoimento prestado à Comissão Estadual da Memória e Verdade, a culpa do então estudante universitário Rogério Matos do Nascimento. Único acusado pelo crime, cometido em 1969, Rogério foi condenado e cumpriu quatro anos de prisão, mas teve a sentença revista pelo Tribunal de Justiça e ganhou a liberdade.
Durante quase quatro horas de depoimento, Jorge Tasso reafirmou que houve, na sua opinião, uma intenção deliberada da polícia de tumultuar e atrapalhar as investigações para proteger os culpados. “O inquérito foi feito com diversionismo, tática utilizada para confundir a opinião pública”, disse. Ele também revelou uma ligação estreita entre agentes do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e integrantes do grupo paramilitar Comando de Caça aos Comunistas (CCC). “Havia reuniões, às quartas e sábados, em Casa Amarela e no Derby. Era quando eles planejavam os atentados”, afirmou.
Jorge Tasso reforçou a versão – levantada em 1988, quando o inquérito foi reaberto pelo Ministério Público de Pernambuco – da participação de outros policiais no sequestro, tortura e morte do padre Henrique, auxiliar do então arcebispo de Olinda e Recife dom Helder Câmara. Entre eles, citou os agentes Rível Rocha (cabo Rocha) e Henrique Pereira (X-9), e o ex-delegado Bartolomeu Gibson, a quem acusou de liderar o grupo.
Tasso contou que ao ser nomeado delegado, em abril de 1971, recebeu na Secretaria de Segurança Pública uma mesa antes ocupada por Gibson. Numa das gavetas, encontrou um pedaço de corda semelhante à que fora usada para amarrar o padre Henrique, e pediu para ver a que estava anexada aos autos do processo. “Constatei que os pedaços se juntavam perfeitamente. Entreguei como prova ao delegado federal Jones Fontenelli, mas nada foi feito”, revelou.
LIGAÇÕES
Relator do caso na Comissão da Verdade, o ex-deputado Pedro Eurico disse que o depoimento de Jorge Tasso confirmou questões essenciais, como a participação efetiva do aparelho de segurança pública do Estado em atentados, além da associação dos agentes com o CCC. Ele acredita que ao longo das investigações será possível fazer uma vinculação entre alguns crimes cometidos em Pernambuco no período imediatamente posterior à promulgação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), que endureceu ainda mais o regime de exceção, e que culminaram com a morte do padre Henrique.
A comissão pretende estabelecer uma relação entre pelo menos quatro crimes: o “metralhamento” da casa de dom Helder, na rua das Fronteiras, e o do Juvenato Dom Vital, na rua do Giriquiti, onde funcionava a Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Olinda e Recife; o atentado à bala – supostamente cometido pelo PM José Ferreira dos Anjos, conhecido hoje como Major Ferreira – que deixou paraplégico o líder estudantil Cândido Pinto, na Torre; e o assassinato de padre Henrique.
Para ampliar os esclarecimentos, a comissão pretende ouvir, no próximo dia 16, o depoimento do padre José Ernani Pinheiro, assessor da CNBB. Ex-vigário-geral da Arquidiocese na época de dom Helder, ele coordenava as pastorais do Recife e Olinda. Antes, no dia 6, o grupo recebe o presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, Paulo Abrão, para assinar um acordo de cooperação entre as duas entidades.
Fonte – Jornal do Commercio