O homem participou e sabe das coisas

(leia o livro para ter idéia) e o governo também – MEMÓRIAS DE UMA GUERRA SUJA – Del. Cláudio Guerra

Página 193, 194, 195 e 196.

……….O processo de abertura política lenta e gradual implantado pelo general Ernesto Geisel acabou gerando desconforto nas nossas bases. Uma pergunta importante passou a incomodar líderes civis e militares: o que fazer com as dezenas de operadores que serviram ao Estado durante os anos de repressão?

A anistia ampla e irrestrita nos absolveu sumariamente dos crimes praticados, mas como nosso grupo passaria a sobreviver? Nós, que éramos proprietários de uma enorme quantidade de armamentos e conhecedores de tantos segredos?

Alguns, que se escondiam sob falsas identidades, acabaram incorporados à própria máquina governamental. Viraram servidores públicos. Outros tiveram sorte diferente. É nesse contexto que o pessoal responsável pelas operações mais perigosas foi absorvido em outras organizações, a maioria relacionada à contravenção.

A decadência dos aparelhos de combate ao comunismo coincide com o crescimento de organizações criminosas ligadas ao tráfego de drogas, à formação de milícias e principalmente ao jogo do bicho. O know-how conquistado com o aparato do Estado agora serviria ao submundo do crime organizado.

Quando o SNI já estava na decadência, me arrumaram um suporte financeiro, passei a ser ajudado pelo jogo do bicho. O trato feito no começo do processo de abertura era o seguinte: se eu ficasse em evidência, me mandariam para a academia de polícia ou para o exterior, como fizeram com os coronéis Ary Pereira de Carvalho e Ary de Aguiar Freire do caso Baumgarten.

Derrotados, porém, meus mentores não tinham mais instrumentos para cumprir o que haviam prometido. Mesmo assim não me deixaram na mão, e a maneira encontrada para me bancar nesse novo contexto foi viabilizar a minha entrada no jogo. O coronel Perdigão me levou para o esquema.

Fui apresentado a Castor de Andrade, que era o chefe dos bicheiros, o mais importante de todos. O jogo funcionava na rua da Alfândega, 10. O lugar era pura ostentação, até as torneiras do banheiro eram de ouro. As reuniões eram freqüentadas por autoridades, políticos, deputados, gente importante.

A relação entre Castor e as Forças Armadas era tão próxima que ele tinha até uma credencial do Cenimar. Ele gostava de usá-la para dizer que era agente, colaboração entre o SNI e o jogo.

………..

Quando voltei a Vitória, virei empresário. Comprei uma parte das bancas do Zé….  …. a rede de colaboração que nós formamos para combater a esquerda continuou, mesmo após o fim do regime militar.

Quando o regime abriu, mesmo depois que acabou o SNI, continuei a ajudar clandestinamente as polícias de SP do Rio, trocávamos informações.

………

Acabou a revolução, mas a irmandade continuou. A irmandade ainda existe, não morreu, os caras ainda servem uns aos outros. …. A nossa irmandade sobreviveu.

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