Anistia Internacional questiona Comissão da Verdade sobre depoimento de Dilma

Em artigo sobre o primeiro ano da Comissão Nacional da Verdade, a Anistia Internacional, organização que defende os direitos humanos, faz críticas ao trabalho do grupo até agora e levanta a possibilidade de a presidente Dilma Rousseff prestar um depoimento público como vítima da ditadura militar no país.

Dilma e outros militantes em interrogatório em Juiz de Fora, em 1972; na fila de trás, de óculos, o ministro Fernando Pimentel (Desenvolvimento)

“Qual seria o impacto de audiência pública em que a presidente Dilma Rousseff contasse sua história como sobrevivente de tortura, e se comprometesse a banir esse crime do país?”, questiona o texto, assinado pelo diretor-executivo da Anistia Internacional no Brasil, Atila Roque, e assessor Maurício Santoro.

Segundo os dois integrantes da entidade, um dos pontos negativos deste primeiro ano da Comissão é a demasiada quantidade de audiências fechadas, “recurso que só deve ser utilizado em situações extremas”.

“A recente sessão com o ex-comandante do DOI-Codi de São Paulo, coronel Carlos Alberto Ustra, também ilustra a importância de ouvir de forma pública os testemunhos de sobreviventes, familiares e ex-agentes da repressão”, afirma o texto.

Dilma atuou em organizações de esquerda durante o período do regime militar e já afirmou em entrevistas ter sido presa e torturada. No ano passado, a Comissão requisitou documentos arquivados em uma sala do Conedh-MG (Conselho de Direitos Humanos de Minas Gerais), em Belo Horizonte, que revelaram torturas sofridas pela presidente até então desconhecidas.

Antes, só se sabia que Dilma tinha sido torturada por militares em São Paulo e no Rio. Em depoimento de 2001, contudo, ela conta que também foi torturada em Juiz de Fora (MG), para onde foi levada em janeiro de 1972.

Procurada pela reportagem, porém, a assessoria da Comissão da Verdade afirma que não há a possibilidade de a presidente ser chamada a prestar um depoimento à comissão, até por uma questão de evitar eventuais críticas sobre personalismo nos trabalhos do grupo.

A criação da Comissão foi aprovada no Congresso e instalada pela presidente no ano passado. Seu objetivo é investigar crimes de violação de direitos humanos cometidos por agentes da repressão ocorridos entre 1946 e 1988, em especial durante a ditadura militar.

 

OPORTUNIDADE

Para a Anistia Internacional, há pontos positivos neste primeiro ano de trabalho, como novos detalhes sobre o desaparecimento do deputado Rubens Paiva, e a correção do atestado de óbito do jornalista Vladimir Herzog, mas muito ainda a avançar.

“Estamos diante de uma oportunidade única de romper com padrões de violações de direitos humanos que ainda persistem em muitas instâncias do Estado no Brasil, como vemos na persistência da tortura em prisões e a violência policial. A Comissão tem apenas um ano de trabalho pela frente e preocupa que seus integrantes tenham que dividir seu tempo entre diversas outras atribuições profissionais.”

A Anistia Internacional ainda diz ser fundamental que o relatório final da Comissão sirva como base para processos judiciais nos questionamentos à Lei de Anistia.

A recomendação que possibilite a responsabilização de agentes públicos ligados a crimes na ditadura militar, porém, ainda é motivo de discussão entre membros do grupo.

Dilma, aos 22 anos, em interrogatório na sede da Auditoria Militar no Rio de Janeiro; ao fundo, oficiais cobrem o rosto

Fotografia da ficha criminal de Dilma Rousseff, de 1970, do Arquivo Público do Estado de São Paulo; em janeiro de 1970, Dilma foi presa em São Paulo e torturada por 22 dias consecutivos, com socos, palmatórias e choques elétricos

Cópia de título de eleitor de Marina, um dos codinomes usados por Dilma Rousseff durante a ditadura militar

 

Fonte – Folha de S.Paulo

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