‘Não me senti cúmplice’, diz fotógrafo de Herzog na Comissão da Verdade

Silvaldo Vieira deu depoimento esta manhã (27) a vereadores. Filho de Vlado acredita que fotógrafo foi cúmplice de ditadores.

Silvaldo Vieira participou de reunião da Comissão da Verdade na Câmara de São Paulo. (Foto: Alice Vergueiro/Futura Press/ Estadão Conteúdo)

O fotógrafo Silvaldo Leung Vieira, autor da imagem do jornalista Vladimir Herzog, morto no DOI-Codi em 25 de outubro de 1975, foi ouvido na manhã desta terça-feira (28) em audiência da Comissão da Verdade da Câmara Municipal de São Paulo. Durante seu depoimento, Vieira disse aos vereadores que não se sente cúmplice dos torturadores de presos políticos durante a ditadura militar.

“Não me senti cúmplice, mas me sentia muito mal, e isso está acontecendo por eu ter começado a vida daquela forma. Minha intenção desde criança era ser fotógrafo, mas eu vi um tipo de fotografia que eu não gostaria de fazer”, afirmou.

Na época, com 22 anos, o fotógrafo era aluno do curso de fotografia do Instituto de Criminalística da Academia de Polícia Civil e estava em sua segunda semana de treinamento quando foi convocado pelo Dops para tirar fotos de um preso morto.

Depois de três anos na função, Vieira abandonou o trabalho no IC e foi para Los Angeles, nos Estados Unidos. Ele ficou 15 anos sem voltar para o Brasil.

Durante a sessão da Câmara, quando questionado se foi colaborador do sistema na época, o fotógrafo disse que foi uma vítima. “Eu me considero mais uma vítima. Era fotógrafo, minha intenção era fotografar. Existiam poucos cursos de fotografia e um dos que existiam era esse do IC. Naquele tempo, o fotógrafo comum não tinha aquele tipo de tecnologia”, respondeu.

Com o passar do tempo, Vieira disse ter notado como era o cenário vivido e teve uma crise de consciência, mas que não teve possibilidade de largar o emprego porque dependia do salário. “É uma opção que me arrependo e não posso mudar. É uma coisa que eu vou ter que levar para sempre”, declarou ele, que disse estar arrependido por ter optado estudar no curso da Polícia Civil, órgão repressor do governo na década de 1970.

Já Ivo Herzog, filho de Vladimir Herzog, não concordou com as declarações de Vieira. “Ele foi um cúmplice, pois foi conivente com a situação e ficou mais três anos no serviço”, desabafa.

O vereador Mário Covas Neto (PSDB), relator do caso, entendeu que o fotógrafo não tinha consciência da situação quando foi convocado para tirar a foto de Herzog. “Não vejo como ele pode ser responsabilizado por qualquer coisa daquela época. Estava começando a vida profissional e vejo como um soldado que cumpre ordens”, disse.

 

Foto Herzog

Apesar da pouca experiência, Vieira conta que achou estranho a posição em que o corpo do jornalista Wladimir Herzog foi encontrado. Apesar de estar enforcado, tinha os pés no chão, uma situação inusitada para quem comete o suicídio.

“Eu pessoalmente achei estranho a posição do cadáver pela posição dos pés, os pés no chão e tudo que estava ocorrendo em volta, a blindagem sigilosa de não deixar tirar outras fotos do local, geralmente a gente tinha acesso ao entorno do local”, disse o fotógrafo. Vieira disse que nunca foi ameaçado, mas orientado a não comentar as cenas que tinha visto. “A única lembrança que eu tenho mesmo era da obrigatoriedade do sigilo.”

Questionado se desconfiou que a cena da morte de Herzog era forjada, o fotógrafo respondeu que só desconfiou dias depois. “Naquele momento eu estava tenso, nervoso, e achei somente estranho. No decorrer da semana ouvindo comentários e achei que fosse realmente um homicídio.”

 

Ele também declarou que não se recorda das pessoas envolvidas quando ele foi convocado para tirar as fotos. Além de não se lembrar do nome de quem lhe pediu para tirar as fotos, nem soube dizer quem eram os policiais que o levaram até a cela.

 

Fonte – G1

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