Estado promove reparação e anistia os estudantes presos em 1968

‘Cerca de mil estudantes com um só grito: não a repressão, não a violência e sim a verdade sobre a ditadura militar’. Essa era a atmosfera que tomou conta da Praça da Resistência, no centro de Ibiúna (a 69 km de SP), neste sábado (15), durante a 71ª Caravana da Anistia, que promoveu ato de reparação coletiva e homenagem aos mais de 700 estudantes presos, em 1968, durante o 30º Congresso da União Nacional do Estudantes (UNE).

Essa edição da Caravana Anistia, que foi aberta com o Hino Nacional e da Internacional Socialista cantados por cerca de mil estudantes, julgou os processos de anistia de Etelvino José Bechara e Gonzalo Pastor Barreda, que estiveram entre os estudantes detidos à época. Além disso, entregou o certificado de anistiado político a mais de 30 brasileiros e brasileiras, que foram detidos em 1968 pelos militares.

O ato da Caravana da Anistia ocorreu como evento paralelo do 11º Congresso da União Estadual do Estudantes Secundaristas de São Paulo (UEE-SP), que foi aberto nesta sexta-feira (14) com a inauguração de um monumento, na entrada principal da cidade, em homenagem às lutas estudantis. A obra foi doada pelo artista plástico Cláudio Tozzi, estudante da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU/USP), de 1968.

Em entrevista ao Vermelho, o presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, ressaltou que este foi o terceiro ato coletivo de reparação pública realizado pela Comissão. Ele lembrou o quão simbólico foram os outros atos de reparação coletiva, sendo o primeiro realizado em São Domingos do Araguaia, no sul do Pará, que na oportunidade concedeu anistia política a 44 camponeses perseguidos pela repressão militar, e o segundo realizado na antiga sede da UNE, localizada no Rio de Janeiro, que foi destruída pelos militares durante a repressão.

Ele também ressaltou a importância de todo o movimento de luta pela verdade. Paulo Abrão destacou que a participação da sociedade no processo de construção da memória e da verdade e fundamental para o aprofundamento da democracia.

“Todas as ações realizadas nesse sentido irão possibilitar a ampliação da participação nos trabalhos de reconstrução da memória, atingindo inclusive as gerações mais jovens. Dependendo do trabalho desenvolvido, ela poderá contribuir de forma importante para os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade. Essas comissões agregam uma virtude ao processo brasileiro”, externou o presidente da Comissão da Anistia.

Sobre a juventude de 1968, ele acrescentou que “ao se engajarem na luta política contra o regime, os jovens de 1968 fizeram a opção de deixar suas vidas pessoais para lutar por seus ideais. Hoje [15 de junho] voltamos a 1968 para não só lembrar e apresentar a essa nova geração o que foi feito lá atrás, mas para que momentos como aquele não retorne jamais”.

Foto: Joanne Mota

 

Para o presidente da UEE-SP, Alexandre Cherno, o movimento estudantil assistiu neste neste sábado ao encontro de duas gerações, a de 1968 com a de 2013. Segundo ele, “esse Congresso representa não só um suspiro de liberdade, mas sim, ele pavimenta os caminhos para que o movimento estudantil continue suas lutas, que não possuem as mesmas proporções e nem direcionamentos de 1968, mas que são fundamentais para o aprofundamento das mudanças do Brasil”.

“Ao realizarmos esse Congresso em Ibiúna ampliamos o combustível para as nossa lutas. Para as lutas que são de todo o povo brasileiro. Além disso, o movimento estudantil desse momento democrático tem o papel estratégico de contribuir nas ações do Estado, que nestes tempos não deverá assumir outro papel que não o de indutor de desenvolvimento”, declarou Cherno ao Vermelho.

Presente durante todas as atividades do Congresso da UEE-SP, a presidenta da UNE, Vic Barros, declarou que a UNE se orgulha de todos os dirigentes, que de forma abnegada, contribuíram para construir o Brasil que conhecemos. “Um ato como esse retrata nosso orgulho e sinaliza nossos desafios. A geração de 1968 apresentou para o Brasil a força do movimento estudantil, que mesmo sufocado naquele momento não se rendeu e continuou sua luta pela liberdade”.

A dirigente estudantil, que é a 5a mulher a assumir a presidência da UNE, lembrou o quão significativo é o trabalho da “Comissão da Verdade Alexandre Vannucchi Leme”, lançada pela UEE-SP em fevereiro. “O silêncio de anos de chumbo está sendo combatido. A nossa luta em defesa de uma sociedade mais justa é também por uma reparação histórica”.

Vic Barros também pontuou os avanços apresentados pela Comissão da Verdade da UNE, que durante o 53º  Congresso da UNE, apresentou seu primeiro relatório sobre a investigação do caso de desaparecimento do estudante Honestino Guimarães. “Foi apresentado um relatório com os detalhes de sua prisão e desaparecimento de Honestino”. Ela também informou que foi lançada na oportunidade a campanha “Onde está Honestino?”, que simboliza a busca por todos que desapareceram durante a ditadura.

Foto: Cezar Xavier

 

Anistiados de Ibiúna

Durante coletiva à imprensa, Paulo Abrão informou a dinâmica da 71ª Caravana da Anistia e esclareceu que dos mais de 700 estudantes presos, apenas 170 deram entrada, na Comissão da Anistia, para iniciar o processo de reparação. Ele também informou que durante o ato a Comissão entregaria certificado de anistiado político aos estudantes que confirmaram presença no ato.

Dentre os presentes, receberam o certificado Augusto Petta, Franklin Martins, José Genoíno, Liége Rocha, Leopoldo Paulino, Marilia Guimarães, Dalmo Ribas, que recebeu pelo seu irmão Antônio Guilherme Ribas, entre muitos outros.

O primeiro processo de reparação lido pela Comissão foi o do ex-estudante Gonzalo Pastor Castro Barreda. Ele militava na política estudantil da Universidade de São Paulo, participando de reuniões e manifestações.

O segundo processo foi o de Etelvino José Henriques Bechara, professor titular do Instituto de Química da USP. Ele foi preso e levado para o Presídio Tiradentes quando participava como representante do Curso de Química da Universidade de São Paulo (USP).

Foto: Cezar Xavier

 

 

Memória e reparação

Ainda durante a coletiva, Paulo Abrão informou que, desde o início dos trabalhos da Comissão de Anistia, já foram julgados cerca de 180 processos de estudantes presos durante o congresso de Ibiúna.

Segundo ele, as Caravanas da Anistia tem por objetivo resgatar a memória e a verdade sobre o autoritarismo, ampliar a transparência dos trabalhos da Comissão de Anistia e disseminar o tema da luta pelas liberdades democráticas.

Foto: Cezar Xavier

 

 

Fonte – Vermelho

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