Apesar de toda a repressão policial, os petroleiros da REPLAN e da RLAM decidiram paralisar as atividades. O resultado foi a intervenção do governo no Sindicato dos Petroleiros da Bahia e demissões de centenas de trabalhadores. Em Paulínia, foram demitidos 153, em Mataripe, 205.
A greve dos Petroleiros, em 1983, tem uma grande importância histórica e contribuiu de forma decisiva para a realização da primeira greve geral durante a ditadura militar, com enfrentamento da famigerada Lei de Segurança Nacional. Neste mesmo ano, em 28 de agosto, nascia a Central Única dos Trabalhadores, a CUT, e com ela o chamado “novo sindicalismo”, a partir da retomada do processo de uma maior mobilização da classe trabalhadora. Trinta anos depois, todos os petroleiros que foram perseguidos e perderam seus empregos no confronto político com os militares foram anistiados. Na Bahia, 150 obtiveram a anistia com reparação, mas outros 55 ainda lutam e aguardam decisão para que seja feita a justiça de forma completa, com a obtenção também da reparação.
Comemorações
Para relembrar e saudar esse fato fundamental para a organização sindical dos petroleiros, os Sindipetros Bahia e Unificado-SP realizarm diversas atividades ao longo desse mês de julho. Em Campinas, será realizado neste sábado, 06, um ato político, que contará com a participação de toda a direção da FUP e diversas representações sindicais. O ato começa às 09 horas, na Regional Campinas do Sindipetro Unificado-SP. Na Bahia, o Sindipetro está produzindo um vídeo, ouvindo em entrevistas os dirigentes demitidos, cassados e depois anistiados.
Garantir que não haveria demissões foi um dos principais motivos que desencadearam a greve dos petroleiros em 1983, segundo conta Antonio Carlos Spis, que começou a trabalhar na Replan em 1º de junho de 1973 como auxiliar de escritório no setor de Pessoal. Num momento em que os militares amordaçavam os sindicatos e tentavam reprimir as mobilizações, os petroleiros decidiram enfrentar a ditadura e, com coragem e determinação, partiram para a greve.
O estopim foi uma carta de intenção do governo para o FMI que indicava redução de custeio de empresas, bancos e serviços públicos. A ditadura brasileira, que começou em 64, assinava cartas de intenção com o Fundo Monetário para receber aporte financeiro e nesses documentos eram determinadas condicionantes. “Traduzimos a carta para a seguinte frase: vai ter demissão! E imediatamente começamos a mobilizar a base contra essa intenção do governo”, lembra Spis. Segundo o sindicalista, não havia diálogo com a Petrobrás e a greve era, naquele momento, a única forma encontrada pelos petroleiros para serem ouvidos. “O presidente da Petrobrás na época, que se chamava Shigeaki Ueki, nunca recebeu o sindicato e o governo nunca deu um passo sequer pra demonstrar que queria conversa com a gente. Ambos, simplesmente, ignoravam nossas reivindicações.
Não nos restou alternativa”, comentou Spis. A insatisfação da categoria era tão grande que a primeira assembleia para discutir a greve reuniu cerca de 450 trabalhadores e todos foram favoráveis à mobilização. “Em um momento de tensão, de ditadura, em que as pessoas tinham medo de falar, os trabalhadores não se intimidaram e demonstraram que queriam greve”, recorda-se Spis.
A segunda assembleia, de acordo com ele, foi decisiva para a realização da greve. Cerca de 600 petroleiros votaram a favor da paralisação. “Decidimos iniciar a mobilização política em julho, fora da data base que é setembro, afinal de contas era uma greve de cunho político contra a ditadura”, afirma o petroleiro.
Foi nos dias de preparação da greve que Spis conheceu o ex-presidente do Brasil Lula, que na época era um grande líder sindical no país. “Eu estava pintando faixa no chão, chamando a greve, e o Lula chegou e me falou: ‘Isso aí dá três anos de cadeia’. Eu nem sabia quem era ele”, conta, rindo, o sindicalista.
Na época, os petroleiros receberam apoio de muitos sindicatos, inclusive do dos bancários e metalúrgicos do ABC, do qual Lula era líder. Segundo Spis, os petroleiros eram vistos como uma categoria elitizada e o fato de realizarem uma greve surpreendeu a todos. “Foi uma surpresa que uma categoria estruturada, com bons salários, pudesse se rebelar. Havia uma máxima de que funcionário da Petrobrás não podia entrar em greve, já que era uma indústria especializada e com altos salários. Desconstruímos toda essa história com nossa coragem de enfrentar a ditadura”, declarou.
A greve, lembra Spis, começou às 23h30 do dia 5 de junho. “Adiantamos o início da mobilização. Foi uma forma de surpreender. Articulamos esse golpe contra a polícia do Exército e os vigilantes da empresa, já que todos imaginavam que a greve começaria no turno da manhã seguinte”, conta.
Durante os dias da paralisação, os grevistas se concentraram em diferentes locais. “Não podíamos ir para casa por causa da pressão da polícia, dos vigilantes e da própria família. Então, concentrávamos todo mundo primeiro no sindicato, depois em um local no Centro da cidade (teatro de arena) e, por fim, no ginásio do Taquaral. Para dar mais proteção e estrutura ao grevista, dormíamos nesses lugares”, recorda Spis.
Cada dia da greve era uma aventura, de acordo com o sindicalista, principalmente por causa da pressão que existia na época. “Havia policiais no nosso encalço. Mandavam pessoas atrás da gente o tempo todo. Soltavam pela imprensa que estava todo mundo demitido. Era tudo muito difícil”.
Ele lembra de um fato curioso. “Nossas mobilizações eram animadas pelo companheiro Gilberto Coelho Marques de Abreu, que sempre cantava a música do Gonzaguinha ‘Desesperar Jamais’. Em uma das ocasiões apareceu um sujeito que tocava violão e começou a animar nossa festa todo final de tarde. Achávamos que ele era um trabalhador, mas, na verdade, era da polícia federal e se infiltrou no nosso grupo para nos delatar”.
Os grevistas resistiram sete dias à repressão, mas não conseguiram o que queriam. “Tentamos encontrar todos os caminhos para negociação, até que não teve mais jeito. Não tínhamos mais o que fazer. Não tínhamos mais alternativa de negociação, nem canais políticos. A ditadura se fechou em copas e nos mandou o recado ‘ninguém negocia’. Queríamos apenas que houvesse um posicionamento do governo ditador do Figueiredo de que não haveria demissão de pessoal, mas não conseguimos e voltamos ao trabalho”.
Fonte: CUT – 08/07/2013