Site com 900 mil páginas de processos da ditadura militar será lançado em SP

Projeto garante acesso a todo o material colhido no início dos anos 80 pela Arquidiocese de São Paulo e pelo Conselho Mundial de Igrejas, o qual revelou torturas praticadas por agentes públicos durante a ditadura

A Procuradoria Regional da República da 3ª Região (PRR3) sediará, no dia 9 de agosto, o ato de lançamento do Brasil Nunca Mais Digit@l, site que disponibilizará cerca de 900 mil páginas digitalizadas de um conjunto de 710 processos da repressão durante a ditadura militar, julgados pelo Superior Tribunal Militar. Com essa iniciativa todo o acervo do Brasil Nunca Mais (BNM), projeto realizado no início dos anos 80 pela Arquidiocese de São Paulo e o Conselho Mundial de Igrejas, poderá ser consultado pela internet. O site trará, ainda, cópia integral dos arquivos do Conselho Mundial de Igrejas e da Comissão Justiça e Paz de São Paulo, os quais revelam os bastidores do projeto, realizado em segredo durante a vigência do regime de exceção.

Com início às 9h45, o ato tem por objetivo apresentar ao público o histórico do projeto, o conteúdo e o funcionamento do Brasil Nunca Mais Digit@l. Com a participação do procurador-geral da República, da coordenadora da Comissão Nacional da Verdade e autoridades dos governos federal, estadual e municipal, membros do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, o evento também se destinará a homenagear todos que participaram do BNM, reputada a mais corajosa e abrangente iniciativa já realizada pela sociedade civil brasileira em prol da verdade e da justiça.

O BNM foi integralmente desenvolvido nos anos oitenta sob a coordenação de Dom Paulo Evaristo Arns e do Reverendo James Wright, com apoio financeiro do Conselho Mundial de Igrejas. Em 15 de julho de 1985, apenas quatro meses após a retomada do regime democrático, deu origem ao livro “Brasil: Nunca Mais”, publicado pela Editora Vozes, que se tornou um sucesso de vendas e referência no tema da violação aos direitos humanos no Brasil.

O acervo do BNM é composto essencialmente de cópias dos processos judiciais que tramitaram no Superior Tribunal Militar, movidos contra presos políticos. Os advogados de defesa perceberam que poderiam reproduzir esses autos, aproveitando-se do prazo de 24 horas de que dispunham para examiná-los fora do STM. Com essa estratégia foram obtidas cópias integrais dos processos e especialmente dos depoimentos prestados pelos presos perante as auditorias militares, nos quais denunciavam as torturas e outros detalhes das violências sofridas, inclusive nomes de perpetradores.

Foram copiados 710 processos em Brasília e, após o material ter sido remetido a São Paulo, uma equipe de advogados, jornalistas, arquivistas e historiadores o examinou e sistematizou. Finalmente, foi escrito um relatório de doze volumes e o livro editado pela Vozes. Diante do temor de apreensão e destruição do material, foi decidido microfilmar todas as páginas produzidas e remeter os filmes ao exterior. Esse trabalho foi empreendido ao longo de seis anos, sob total sigilo. Participaram do BNM, dentre muitos anônimos: Frei Betto, Ricardo Kotscho, Paulo Vannuchi, Sigmaringa Seixas, Luiz Eduardo Greenhalgh, Eny Raimundo Moreira e Charles Harper.

BNM Digit@l – A digitalização e divulgação do acervo do BNM objetiva preservar esse patrimônio histórico nacional, ampliar o acesso ao material de pesquisa e revelar a história de concepção e desenvolvimento dessa iniciativa social. O trabalho foi iniciado em 14 de junho de 2011, quando o Ministério Público Federal repatriou do “Center for Research Libraries” (CRL), nos EUA, os microfilmes de segurança que continham cópia de todos os processos judiciais reproduzidos pelo BNM e o procurador-geral da República recebeu do secretário-geral do Conselho Mundial de Igrejas os arquivos daquela entidade sobre o projeto.

O BNM Digit@l é uma parceria de diversas entidades comprometidas com a promoção dos direitos humanos: Ministério Público Federal, Armazém Memória, Arquivo Público do Estado de São Paulo, Instituto de Políticas Relacionais, Conselho Mundial de Igrejas, Comissão Nacional da Verdade, Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Rio de Janeiro, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Universidade de Campinas (Arquivo Edgard Leuenroth), Universidade Metodista de São Paulo, Center for Research Libraries, Arquivo Nacional e Rubens Naves, Santos Jr., Hesketh Escritórios Associados de Advocacia. O projeto também recebeu apoio do Superior Tribunal Militar e do Consulado Brasileiro em Chicago.

 

Fonte – Jornal Jurídico

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