Lamento de familiares durante o período da ditadura militar no Brasil ganhou o mundo e deu combustível para criação de entidades e movimentos pacifistas
Membros durante os trabalhos da Comissão da Verdade
A escuridão dos anos de chumbo, com seu efeito mais devastador entre 1968 e 1975, acabou produzindo um dos mais eficazes movimentos de solidariedade que se tem notícia na história da República: as redes que ficaram conhecidas como comissões de mortos e desaparecidos políticos, das quais derivam uma infinidade de entidades de direitos humanos institucionais e da sociedade civil em todo o País.
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O silêncio criminoso do Estado ditatorial e a incerteza do paradeiro dos que sumiram a caminho das prisões promoveram, nos anos de 1970, o encontro de familiares de desaparecidos políticos que nem se conheciam. Encontravam-se inicialmente nos pátios de delegacias, nas cercanias dos porões de tortura ou nas salas dos IMLs (Instituto Médio Legal).
Agência Brasil
Destes encontros, numa época em que a internet era ainda tema da ficção científica, passaram a se reunir clandestinamente em residências ou em qualquer espaço seguro para trocar informações, elaborar – nome por nome – listas e mais listas de desaparecidos ou produzir relatórios sobre os agentes do regime responsáveis pela barbárie que o País desconhecia.
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O lamento dos familiares ganhou o mundo pelas denúncias de tortura e desaparecimentos e deu combustível aos movimentos pacifistas que levaram o regime militar ao desgaste e, finalmente, à sua derrocada, com a devolução do poder aos civis, em 1985.
Foi a solidariedade das famílias a matriz das manifestações que levaram milhares de pessoas às ruas para protestar contra assassinatos que chocaram o País e, mais tarde, já em 1979, ajudaram a exigir uma lei de anistia que, ainda que capenga, esvaziasse as prisões e permitisse a volta dos exilados.
A autenticidade, a justa causa e a força da rebeldia de mães, pais e irmãos de desaparecidos envolveriam sindicatos e partidos políticos, e contribuiriam para outras conquistas: as primeiras eleições diretas para governador, em 1982, e o fim do regime militar, em 1985, logo depois da campanha das diretas para a presidência cujo resultado foi o “fechamento” do Colégio Eleitoral que produzia, com a chancela de um dominado e obediente Congresso, os ditadores e os senadores biônicos.
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Ainda na esteira da luta dos familiares veio a primeira ação penal contra a ditadura, movida em 1982 e assinada por mais de duas dezenas de mães dos ativistas do PCdoB que ainda estão desaparecidos no Araguaia. Ela resultou, em 2010, na condenação do Brasil na Comissão de Direitos Humanos na Organização dos Estados Americanos (OEA).
A luta que brotou da solidariedade de familiares levou também à criação da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos e, mais recentemente, da Comissão Nacional da Verdade. Embora a solidariedade tenha plantado sementes, quase três décadas após o fim do regime, o governo brasileiro ainda deve ao País e às famílias o esclarecimento dos crimes da ditadura e a localização de pelo menos 142 militantes da luta armada.
Fonte – IG