Pelo menos 40 estudantes de Santa Catarina sofreram algum tipo de repressão e três deles acabaram assassinados durante a ditadura militar (1964-1985). O levantamento, produzido pelo Coletivo Catarinense Memória, Verdade e Justiça, foi entregue nesta segunda-feira à Comissão Estadual da Verdade Paulo Stuart Wright.
Deputado Edison Andrino relatou sua participação no congresso de estudantes de 1968, quando foi preso. Foto: Juliana Stadnik / Assembleia Legislativa/DivulgaçãoO grupo de SC trabalha agora na busca de mais informações sobre esses estudantes. O objetivo é tentar ouvir aqueles que ainda estão vivos para identificar as circunstâncias das prisões e torturas sofridas na época.
A pré-apuração realizada pela professora e escritora Derlei Catarina De Luca mostra que ocorreram prisões de catarinenses em momentos históricos, como aNovembrada (1979) — grande manifestação de estudantes feita em Florianópolis durante uma visita do então presidente João Figueiredo — e ainda o Congresso de Ibiúna (1968) — quando cerca de mil jovens de todo o Brasil se reuniram secretamente em um sítio no interior de São Paulo para eleger os novos dirigentes da União Nacional dos Estudantes (UNE), que na época funcionava de forma clandestina.
— Lembro que passamos pouco mais de uma semana incomunicáveis, passando fome e frio — disse o deputado estadual Edison Andrino (PMDB), um dos catarinenses presos em 1968 no Congresso de Ibiúna.
Ao todo, dos 16 estudantes convidados a falar na sessão de ontem na Assembleia Legislativa de SC, somente sete acabaram contando um pouco do que viram e ouviram na prisão à Comissão da Verdade. Gente que viveu o golpe de 1964, esteve no Congresso de Ibiúna em 1968 e ainda participou da Novembrada de 1979. Além do próprio deputado Andrino, ocorreram os depoimentos de Valdir Izidoro Silveira, Inácio Mafra, Markian Getúlio Kalinoski, Gerônimo Vanderlei Machado e Wladimir Salomão Amarante.
Um dos relatos mais emocionantes foi o do médico Roberto Maciel Cascaes, que tinha 18 anos quando foi preso, em janeiro de 1969. Ligado aos movimentos estudantis da época, contou que foi detido quando saía de casa, na Travessa Ratcliff, no Centro de Florianópolis.
— Me puseram descalço em cima de uma lata de leite em pó. Levei socos e pontapés da uma da tarde às nove da noite — disse, com a voz embargada, ao relembrar o episódio.
Depois de sessão de tortura, Cascaes foi levado para Biguaçu e ainda para Curitiba, onde ficou durante quatro meses. Entre idas e vindas, calcula ter passado um ano na cadeia. Viveu na clandestinidade.
Entre os 40 estudantes catarinenses identificados como vítimas da ditadura, três foram assassinados: Frederico Eduardo Mayr (morto em 1972), Luiz Eurico Tejeda Lisboa (1972) e João Batista Rita (1974).
Relatório até fevereiro
A Comissão Estadual da Verdade Paulo Stuart Wright foi criada em 1º de março de 2013. O objetivo é buscar informações sobre as violações dos direitos humanos que tiveram motivações exclusivamente políticas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988 e auxiliar os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade (CNV). Os pesquisadores de Santa Catarina trabalham para enviar um relatório à Comissão Nacional da Verdade até 10 de fevereiro de 2014.