Na avaliação dele, a Corte vai manter a decisão adotada em 2010, segundo a qual agentes de Estado acusados de crimes de lesa humanidade no período da ditadura também foram beneficiados pela lei e não podem ser levados a julgamento. “Com isso, o Brasil acaba pagando um preço que não deveria. No cenário internacional fica como uma republiqueta de banana, onde aquilo que está consagrado internacionalmente não se realiza aqui”, disse.
“Aplaudo o procurador-geral, mas aguardemos as manifestações do Supremo. Até agora ele tem sido contraditório e conservador.”
Na quinta-feira (17), o Estado mostrou que o procurador-geral, ao se manifestar sobre a prisão e extradição de um argentino acusado de sequestro e tortura de militantes políticos no período da ditadura militar, questionou vigorosamente a Lei da Anistia em vigor no Brasil. Lembrou que o País é signatário de convenções internacionais segundo as quais violações de direitos humanos são considerados crimes imprescritíveis e não podem ser perdoados.
A manifestação repercutiu favoravelmente em setores do Ministério Público Federal, em organizações de direitos humanos e na Comissão Nacional da Verdade. No STF, porém, não deve alterar em nada o que já foi decidido sobre a questão, segundo informações da repórter Mariângela Gallucci.
Foi sobre esse debate que Krischke, com uma longa militância na área de direitos humanos, falou ao blog.
Como você viu a manifestação do novo procurador-geral sobre a anistia no Brasil?
Aplaudo o procurador-geral, mas aguardemos as manifestações do Supremo. Até agora ele tem sido contraditório e conservador.
O que acha do argumento de que a Lei da Anistia deve ser mantida porque foi necessária para a transição do estado autoritário para a democracia?
Não houve transição no Brasil. O que vimos foi uma transação, que está sendo perpetuada. Quando, lá atrás, o então presidente da OAB, o doutor Cezar Britto, me disse que estava prestes a apresentar ao Supremo uma ADPF questionando a anistia a torturadores, eu disse a ele: Não faça isso. Porque essa questão não é jurídica, mas sim política. Olhando o cenário atual, eu sei que vamos perder. E quando isso acontecer, iremos falar com quem? Com o núncio apostólico, para interceder por nós lá no céu?
De lá para cá não mudou nada?
O Supremo continua com o mesmo conservadorismo e tomando decisões contraditórias. Quatro anos atrás, numa decisão sobre o caso de um depositário infiel, o STF disse que ele não podia ser preso porque tratados internacionais sobre direitos humanos ratificados pelo Brasil, como a Convenção Americana de Direitos Humanos, proíbem a prisão por dívida. Esse mesmo tribunal, porém, ignora as convenções quando trata do caso de pessoas acusadas de terem cometido crimes de lesa humanidade. O procurador-geral se baseia nessa jurisprudência internacional para dizer que os crimes em questão são insuscetíveis de graças e benefícios.
Por Roldão Arruda – jornalista e repórter da editoria de política do Estadão. Dedica-se sobretudo à cobertura de temas relacionados a direitos humanos e questões de movimentos sociais.