Justiça reconhece que Drummond morreu sob tortura no DOI-Codi

Nesta terça-feira (18), o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou improcedente, por 2 votos a 1, o pedido do Ministério Público de São Paulo, que recorreu de decisão proferida em 18 de abril de 2012, argumentando que “tortura é causa remota da morte, não podendo assim constar na certidão de óbito”. “É uma grande vitória para nós, mas, sobretudo para a família de João Batista Franco Drummond”, declarou ao Portal Vermelho o advogado Egmar José de Oliveira.

Na certidão do óbito expedida quando da morte de Drummond, fornecida pela ditadura militar, constava traumatismo craniano provocado por atropelamento na Avenida 9 de Julho, esquina com a Rua Paim, localizada no centro da cidade. Como em vários outros casos, os militares suprimiram os atos de tortura dos documentos que atestavam o óbito.

“Se encerra aqui um capítulo da história da família de João Batista Franco Drummond que agora poderá, a partir da emissão do novo registro de óbito, apresentar aos seus filhos e netos o que de fato ocorreu, em São Paulo, no dia 16 de dezembro de 1976”, destacou Egmar José de Oliveira, ex-conselheiro da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.

 

Voto anticomunista

Egmar destacou ao Vermelho que o resultado da votação demonstra que ainda há um longo caminho para vencer o conservadorismo no Poder Judiciário, especialmente porque algumas questões da luta pela verdade e justiça dependem da decisão dessa esfera. “O Poder Judiciário é recalcitrante com relação a essas questões e isso ficou evidenciado no voto divergente, que reputo ser um voto anticomunista. O relator não teve nenhum pudor em dizer que o seu voto tem um conteúdo ideológico, portanto é um conteúdo anticomunista”, denunciou.

Para ele, o resultado convida a todos para uma reflexão sobre o papel ideológico e de classe que existe no comportamento de muitos juízes e no Ministério Público. “É ilusão imaginarmos que o Poder Judiciário possui total isenção e isso se aplica ao Ministério Público também”, afirmou.

Foto: Joanne Mota

 

De acordo com o advogado, o pedido de retificação de óbito de Drummond foi o primeiro a ser feito no Brasil, a pedido de sua família, Maria Ester Cristelli e suas filhas, Rosa e Silvia, quando a Comissão Nacional da Verdade ainda não estava instituída. As outras duas alterações foram nas certidões do jornalista Vladimir Herzog e do estudante Alexandre Vannucchi Leme.

No entanto ele sinalizou uma diferença de tratamento. “Com todo respeito, e é legítimo o que foi pleiteado pelas famílias do Alexandre e do Herzog, mas o tratamento deve ser igual para a família do Drummond. E a diferença de tratamento ficou demonstrada no curso desse processo. Precisamos refletir sobre esse posicionamento”, ponderou.

 

Tentáculos da Ditadura

Durante a defesa, Egmar José de Oliveira destacou que o julgamento em questão ultrapassa os méritos. Para ele, reconhecer a morte de Drummond por tortura no DOI-Codi, e ter isso em sua certidão de óbito, é apenas mais um tijolo no grande muro que apresenta a verdade sobre os crimes praticados durante a ditadura militar e mais um passo para romper os tentáculos dessa herança sombria.

Segundo ele, isso demonstra para a sociedade brasileira que a luta pela restauração da verdade e pela consolidação do estado democrático de direito é uma luta que está apenas começando.

“Esse mesmo tribunal, que julga o caso de Drummond, também sofreu intervenção do regime ditatorial com a cassação de três magistrados, sendo um desembargador e dois juízes, um deles inclusive militante do Partido Comunista do Brasil. Um tribunal que é composto por membros que desconhecem esse capítulo da história precisa passar por mudança. E as mudanças que conclamamos nas ruas, elas atingem, também, o Poder Judiciário”, afirmou o advogado.

 

Foto: Angelina Anjos

 

Apoio

O reflexo do simbolismo do julgamento e pelo reconhecimento da luta pelos que tombaram durante a ditadura, a sessão mobilizou diversas entidades e amigos.

 

Entre as mais de 40 lideranças presentes estavam: o deputado estadual Alcides Amazonas, (PCdoB-SP); Jamil Murad, presidente do PCdoB-São Paulo; Adriano Diogo, deputado estadual (PT-SP); Vital Nolasco, membro do Comitê Central do PCdoB; Ivânia Pereira, secretária da Mulher da CTB; Rogério Nunes, secretário de Movimentos Sociais da CTB; Amelinha Teles, assessora da Comissão da Verdade Rubens Paiva; Carlos Eduardo Siqueira, presidente da UJS/SP; Elizeu Teles, advogado e chefe de gabinete da deputada estadual (PCdoB-SP), Leci Brandão; Angelina Anjos representando o Comitê Paraense pela Verdade, Memória e Justiça; e, representantes da Fundação Maurício Grabois e dos partidos PSTU, Psol, PCR, entre outros.

 

Fonte – Vermelho

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