A Comissão Nacional da Verdade realiza sua segunda audiência pública em Dourados (MS) nos próximos dias 25 e 26 de abril, no cine-auditório da UFGD. Nesta segunda sessão serão apresentados nove casos de violação de direitos humanos contra os indígenas em Mato Grosso do Sul, ocorridas no período estabelecido pelo mandato da CNV (1946-1988). A violência sistemática contra os índios no Estado culminou em sua expulsão de seus territórios tradicionais.
Indígenas do Mato Grosso do Sul aguardam para prestar depoimento na primeira audiência da CNV em Dourados. Foto: Marcelo Christovão / ASCOM – MPF-MSA audiência contará com a presença das etnias guarani-ñandeva, guarani-kaiowá, terena, kadiwéu, kinikinau, ofaié-xavante e guató, todas de Mato Grosso do Sul. Especialistas acompanharão os depoimentos devido à dificuldade dos indígenas com a língua portuguesa.
Esta é a segunda audiência da CNV exclusiva para ouvir indígenas. Integrante da Comissão Nacional da Verdade, a psicanalista Maria Rita Kehl já percorreu vários Estados para ouvir indígenas em suas terras. Ela esteve com os Guarani do Paraná, Suruí do Pará, os waimiri e ianomamis de Amazonas e Roraima, os pataxó e tupinambá da Bahia e os kayowá do Mato Grosso do Sul. Além disso, a psicanalista recebeu os xavante de maraiwatsedé, do Mato Grosso, em Brasília.
Para Maria Rita Kehl, ouvir os índios é fundamental para o trabalho que ela vem desenvolvendo a frente do grupo de trabalho “Graves violações de Direitos Humanos no campo ou contra indígenas”: “Aprendi, ao escrever meus capítulos sobre graves violações de direitos humanos contra camponeses e indígenas, que não basta documentar as violências ocorridas. A sociedade brasileira desconhece grande parte do que ocorreu com os camponeses, e mais ainda com os índios. Muita gente, de boa fé, me pergunta: ‘mas os índios lutaram contra a ditadura?’. Por isso, para melhor sensibilizar a sociedade e melhor qualificar os muitos tipos de violações graves sofridas por estes brasileiros de regiões isoladas do país (principalmente no período de 1946 a 88, coberto pela CNV), entendi a importância de colher depoimentos das vítimas. Só assim consigo transmitir aos leitores não apenas as graves violações cometidas por agentes do Estado, ou com sua conivência (como ocorre até hoje), mas também parte da cultura das vítimas, da sensibilidade particular de cada sub grupo, de cada etnia. Espero que meu relatório tenha também este efeito, de sensibilizar o Brasil para a enorme riqueza cultural e subjetiva que se perde com a destruição das condições de vida de camponeses e indígenas”.
Segundo o MPF-MS, as informações e depoimentos desta segunda audiência vão somar com as já colhidas pela Comissão Nacional da Verdade em 21 de fevereiro, na 1ª audiência da CNV voltada para os direitos indígenas no país. Poderão servir como base para possíveis pedidos de indenização coletiva, ou outras ações compensatórias, em favor das comunidades indígenas.
Para o procurador da República Marco Antonio Delfino, “é importante que nós entendamos este processo histórico, que ocasiona 60 suicídios ao ano. A violência sistêmica começou lá atrás, capitaneada pelo Estado brasileiro. Crimes foram cometidos, remoção de populações inteiras, para atender interesses particulares. Estamos resgatando o direito à verdade, à reparação e, principalmente, agindo para que isso não se repita”.
O evento é uma realização conjunta da CNV, do Ministério Público Federal do MS, do Ministério Público do Trabalho, da Funai e da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) e da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul, mesmos parceiros da primeira edição e contará com transmissão ao vivo da UFGD. Você poderá assistir a transmissão da audiência, produzida pela UFGD, no site da CNV, em www.cnv.gov.br/aovivo
Neste vídeo, produzido pela equipe de comunicação do MPF-MS, que reúne imagens da primeira audiência realizada em Dourados, em 21 de fevereiro, é possível ter uma ideia do drama vivido pelos indígenas no Estado: https://www.youtube.com/watch?v=tDKhFFXiJZE
Confira a programação completa da audiência aqui
A população indígena de Mato Grosso do Sul é a segunda maior do país, com mais de 70 mil pessoas. A maior etnia é a dos guarani, que habitam territórios ao sul do estado. A taxa de mortalidade infantil entre a etnia guarani-kaiowá é de 38 para cada mil nascidos vivos, enquanto a média nacional é de 25 mortes por mil nascimentos. Já a taxa de assassinatos – cem por cem mil habitantes é quatro vezes maior que a média nacional.
RELATÓRIO – As audiências serão precedidas, no dia 24 de abril, às 19h, por uma apresentação do pesquisador Marcelo Zelic, do projeto Armazém Memória, sobre o Relatório Figueiredo. O relatório, produzido em 1968 pelo procurador da República Jader de Figueiredo Correia, foi localizado por Zelic no Museu do Índio. Antes, julgava-se que o relatório havia sido destruído em um incêndio.
O relatório aponta que latifundiários e funcionários do extinto Serviço de Proteção ao Índio (SPI) estiveram envolvidos em torturas e outras graves violações de direitos humanos contra os índios. Segundo Maria Rita Kehl, o relatório deve ser incorporado como um anexo do relatório final da CNV que será entregue à presidenta Dilma Roussef em dezembro deste ano.
SERVIÇO
O quê: Segunda Sessão de Audiência da CNV para apurar violações de Direitos Indígenas em Dourados (MS)
Quando: 25 e 26 de abril de 2014
Horário: 7h30 (nos dois dias)
Onde: Cine auditório da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)
Endereço: R. João Rosa Góes, 1761, Dourados – MS
Fonte – Comissão Nacional da Verdade/Assessoria de Comunicação