Em reunião anual de prestação de contas, empresa alemã também terá de se explicar sobre venda de caminhões com jatos d’água para PM do Rio
Os acionistas pedirão explicações sobre a venda de carros e jatos d’água para a repressão de protestos no RJ
A Associação de Acionistas Críticos questionará hoje (13) a relação entre a Volkswagen e a ditadura brasileira (1964-1985), durante a reunião anual de prestação de contas da companhia, em Hannover (Alemanha). Os acionistas também pedirão explicações sobre a suposta venda de carros e jatos d’água para a repressão de protestos no Rio de Janeiro.
“Nós exigimos que a Volkswagen investigue e esclareça imediatamente esses casos, tendo em vista o recente aniversário de 50 anos do Golpe Militar brasileiro. A Volkswagen deve admitir e assumir sua responsabilidade histórica no fato”, argumenta o documento que estádisponível na internet.
No caso do envolvimento com a ditadura militar, a Volkswagen deverá responder sobre as contribuições financeiras dadas ao Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipes) e ao Grupo Permanente de Mobilização Industrial (GPMI da Fiesp), diretoria criada na federação das indústrias em abril de 1964. De acordo com a Associação de Acionistas Críticos, esse dinheiro teria sido usado para a construção de um complexo militar-industrial no Brasil, sob a orientação da Escola Superior de Guerra (ESG).
Além disso, os representantes da empresa alemã serão obrigados a se posicionar sobre a denúncia de que ao menos três funcionários da sua subsidiária Scania foram demitidos e tiveram informações repassadas à Delegacia de Ordem Política e Social (Dops) depois que a polícia os prendeu por, supostamente, fazerem parte de um “movimento socialista”.
A Associação de Acionistas Críticos é um grupo sem fins lucrativos que possui ações em mais de 25 das maiores empresas da Alemanha e, por isso, tem o direito de se posicionar nas reuniões anuais de apresentação de balanço. A companhia questionada é obrigada a responder algo no mesmo evento.
Em relação à venda de jatos d’água, a associação argumenta que a simples existência desse produto entre os oferecidos pela Volkswagen “é incompatível com princípios éticos da empresa”. O documento lembra ainda que esse tipo de arma já foi usada na Turquia, quando a população ocupou a Praça Taksim contra a construção de um empreendimento imobiliário.
O GPMI da Fiesp
O GPMI foi uma diretoria criada dentro da Fiesp oficialmente em 30 de abril de 1964; caracterizada como “o ponto de partida dos negócios entre a indústria e a ditadura”, segundo o jornalista e ex-militante Antônio Carlos Fon. Seu objetivo oficial seria readaptar o parque industrial brasileiro à produção de equipamentos bélicos. Sua atuação, entretanto, era mais profunda: remonta às células de logística da conspiração que se preparavam para derrubar o presidente João Goulart desde 1961.
A empresa Volkswagen do Brasil aparece nas atas de reunião do GPMI como uma das “firmas que doaram verbalmente” ao grupo.
Evidenciando a relação próxima entre as Forças Armadas e as grandes empresas, a diretoria do GPMI era obrigatoriamente composta por membros civis e militares. Uma desses dirigentes era o general e ex-ministro Edmundo Macedo Soares e Silva, militar brasileiro que teve destacada passagem por diversas megaempresas, entre as quais estava a Volkswagen – além de Mercedes Benz, Mesbla, Banco Mercantil de São Paulo e Light, conforme aponta o historiador e cientista político uruguaio René Armand Dreifuss em seu livro 1964: A conquista do Estado.
Contatada por Opera Mundi na última quinta-feira (8), a assessoria de imprensa da Volkswagen respondeu apenas na tarde de ontem (12). “A Volkswagen está aberta a contribuir com o trabalho da Comissão da Verdade e permanece à disposição para colaborar com as informações que forem necessárias.”
Fonte – Rede Brasil Atual