A Ocupação Zuzu, evento que reúne um vasto acervo de documentos; fotos; cartas e criações de Zuzu Angel, foi inaugurada na noite desta quarta-feira (14), no Paço Imperial, Zona Central do Rio de Janeiro. Além dos espectadores, a abertura reuniu representantes da Comissão Nacional da Verdade (CNV), familiares da estilista e companheiros de militância de Stuart Angel, filho de Zuzu, morto e torturado pela ditadura.
Uma das curadoras da exposição, Valeria Toloi, falou um pouco sobre a organização do trabalho, que já passou por São Paulo após um trabalho de oito meses. O Rio, a princípio, será o último lugar a receber a Ocupação Zuzu. “Foi um trabalho bacana. A gente ia praticamente toda semana para o Instituto Zuzu Angel. Descobrimos um monte de coisas em caixas, um vasto acervo. A Hildegard guardou tudo que era da mãe dela, muito organizado. Tinham coisas que nunca haviam sido mostradas. Precisamos fazer uma pesquisa para decidir a linha e o conceito do que queríamos colocar aqui porque é impossível colocar tudo, eram muitas peças. Foi um trabalho bem longo”, contou. A exposição reúne aproximadamente 400 peças, mas, segundo Toloi, “muita coisa ainda ficou de fora”.
A curadora diz ainda que Hildegard acompanhou todo o processo de preparação para a exposição, que é composta por vestidos originais, bolsas, porta copos, porta óculos, estudo de desenhos de estampa, croquis e pequenas amostras de tecido. “A Zuzu usou seu trabalho para contar o que estava acontecendo no Brasil. Nós trouxemos documentos, cartas e matérias de jornais daquela época [ditadura militar]. Além dos vestidos que estão na Sala do Luto”, acrescenta. Os anjinhos, marca registrada da estilista, estão presentes em toda a exposição.
Emocionada, Hildegard Angel, filha de Zuzu, prestigiou o evento. Acompanhada do marido, ela, que também é uma das curadoras da exposição, fez questão de ressaltar a importância política da Ocupação. “É uma sensação de um dever cumprido, mas não completo. Este é um dever que estará sempre sendo realizado porque esta chama nunca pode se apagar. No dia que essa chama se apagar, essa história não pode parar de ser contada e a memória não pode se extinguir. O dia que essa chama se apagar, uma tragédia poderá se abater sobre o país porque um país sem história corre o risco de sofrer retrocessos. Não nós podemos deixar que essa história se repita no Brasil”, enfatizou
A exposição vai além da moda e relembra os anos de ditadura. Perguntada sobre o atual e conturbado momento político, às vésperas das eleições, Hildegard reforça a importância de relembrar o passado. “Nós temos que estar sempre alertas, de olhos bem abertos porque o perigo do obscurantismo sempre nos ronda”, reflete. Em meio aos espectadores, artistas andavam vestindo réplicas de peças desenhadas por Zuzu, segurando uma foto de Stuart e cópias das cartas enviadas pela estilista quando procurava por seu filho.
Além da política a exposição traz com força a questão da moda, arte de Zuzu Angel. Embora pareçam completamente distintos, ambos os temos estão fortemente presentes na vida da família Angel Jones. Valdy Lopes Jn, curador da exposição, acredita que “Zuzu fez genialmente a mistura entre moda e política, com sacadas de leveza. Os vestidos políticos foram bordados como desenhos infantis, em fundo branco, por exemplo. Eu acho que a Ocupação Zuzu também mostra a moda como uma maneira de se expressar na arte. É mais do que a moda que se está acostumado a pensar, que é usual ou fashion. É como se expressar através dela e a Zuzu mostrou bem isso. É difícil misturar política e moda, mas ela deu uma bela aula. Ela pegou pelo lado da leveza, da metáfora, dos significados. As camadas de informação que a moda traz são uma forma interessante para refletir o lado político”, avaliou.
O presidente da Comissão Nacional da Verdade, Pedro Dallari, também esteve no evento e lembrou a morte de Stuart Angel e os desaparecimentos durante a ditadura militar. “Essa Ocupação é importante para o resgate da memória, que é grande objetivo da Comissão Nacional da Verdade. Lembrar da Zuzu Angel e da sua luta é muito importante. Talvez ela tenha sido a pessoa assassinada pelo Exército pelo motivo mais absurdo: porque ela buscava o paradeiro do seu filho morto”, reforça. Dallari lembra que, contando com Stuart, ainda há cerca de 160 desaparecidos da ditadura, ou seja, pessoas que foram presas e cujos corpos não foram encontrados. “A Comissão Nacional da Verdade tem feito uma investigação muito intensa, mas nós chegamos em um ponto em que ou as Forças Armadas Brasileiras se dispõe a reconhecer as graves violações de direitos humanos que perpetraram e nos ajudam nessa busca ou vai ser muito difícil ir além do que nós conseguimos”, revela. Dallari diz ainda que existem duas versões sobre o paradeiro do corpo de Stuart, mas que ele ainda não foi encontrado. O presidente da CNV enfatiza que a maior dificuldade de avançar nas investigações é a resistência das forças armadas.
Paul Niemeyer e Fernando Peregrino também estiveram no Paço ImperialA inauguração da Ocupação Zuzu aconteceu juntamente com a exposição Clássicos e Inéditos, que reúne o acervo de Oscar Niemeyer. Paul Niemeyer,neto do arquiteto, compareceu à cerimônia e se disse admirado. “Eu achei a exposição belíssima. Eu já vi muitas exposições do Oscar e em todas elas a gente se surpreende. É fantástico ver as obras dele, os desenhos, o carinho que ele tinha com a arquitetura e a maneira que ele tentava contemplar a população através do seu trabalho, sempre fiel aos seus ideais. É admirável”, analisou. Sobre e Ocupação Zuzu Angel, Paul acredita que “esta é uma bela homenagem à Zuzu Angel. Bela e válida. Houve um encontro foi muito interessante aqui esta noite”.
O deputado federal Fernando Peregrino também esteve no Paço Imperial e comentou a junção das obras de Niemeyer e Zuzu. “A Zuzu Angel mostra um período cruel da nossa ditadura. Oscar vai ser sempre lembrado pelas suas obras. Então, foi um encontro bastante político sim e vai ficar na história do nosso povo”, analisou.
Serviço
Duração: de 14 de agosto a 2 de novembro de 2014
Local: Paço Imperial – Praça Quinze de Novembro, 48 / Centro, Rio de Janeiro – RJ
Horário de funcionamento: Ter-Dom, 12h -18h
Telefone (21) 2533 4359
Entrada Franca
Performance das atrizes – Horário: 12h às 18h
Datas: 16 e 17 de agosto, 13 e 14 de setembro, 18 e 19 de outubro, 1 e 2 de novembro
Fonte – Jornal do Brasil