Ditadura planejou bombardear praça em Goiânia

Militar revela que área em que se reuniam 10 mil pessoas em Goiânia seria atacada se governador não renunciasse

Paulo Rubens Diniz disse que o atentado foi suspenso 15 minutos antes da hora prevista para ocorrer

 

O coronel da reserva Paulo Rubens Pereira Diniz depôs nessa terça-feira à Comissão Nacional da Verdade (CNV), em Belo Horizonte, e revelou que foi enviado pelo Batalhão da Guarda Presidencial (BGP), onde estava lotado, em novembro de 1964, para ir até Goiânia bombardear a Praça Cívica, em frente ao palácio do governo, em que estavam reunidas cerca de 10 mil pessoas apoiando o então governador Mauro Borges (PSD). O chefe do Executivo sofria forte oposição do governo militar – que havia dado o golpe em 31 de março daquele ano – e renunciou ao cargo.

“Quinze minutos antes do momento de bombardearmos (a praça), a ordem foi suspensa, com a renúncia do governador”, contou o militar, que se dispôs a depor

voluntariamente. Além do coronel da reserva, outros nove agentes da repressão e pessoas acusadas de serem ligadas a grupos da extrema direita foram convocados pela CNV, mas apenas dois compareceram. O depoimento do coronel Diniz surpreendeu Pedro Dallari e José Carlos Dias, os dois membros da CNV que fizeram as perguntas. Dallari comparou o fato à tentativa de atentado no Riocentro, em 1981.

Em 1964, o coronel Diniz era tenente e trabalhava no BGP, responsável pela segurança do presidente Castello Branco. Obedecendo a uma ordem do general Carlos de Meira Mattos – que sucedeu Mauro Borges no governo de Goiás –, Diniz foi enviado a Goiânia e preparou o arsenal para bombardear a praça. “Eu teria cumprido a ordem”, afirmou o militar.

A pressão sofrida na época, segundo ele, o levou a ter problemas de saúde. “Isso abala qualquer um”, afirmou. Além disso, o militar afirma que episódios em que contrariou os militares que estavam no poder contribuíram para que ele não conseguisse evoluir na carreira. “Não consegui fazer o curso do Estado-Maior”, lamentou. Ele citou um episódio, em 1966, em que inocentou um morador de Lavras que era acusado de ser comunista, e outro, em 1968, em que levou religiosos presos no Colégio Militar, em Belo Horizonte, para passar o Natal na casa dele e depois contribuiu para que fossem soltos. O militar manifestou que deseja ser anistiado pelo que passou, mas ainda não fez o pedido ao Ministério da Justiça.

Além de ter atuado em Belo Horizonte, Diniz foi comandante em Alto Solimões, no Amazonas, onde treinou uma tropa de indígenas para combater os chamados “subversivos”, que se organizavam na Região do Araguaia em movimento que ficou conhecido como Guerrilha do Araguaia, quando os guerrilheiros foram dizimados pelo Exército Brasileiro. Porém, Diniz afirma que não participou de combate com os militantes.

O segundo tenente do Exército Jair Arvelos Rosa, que em 1968 e 1969 trabalhou como escrivão no 12º RI também prestou depoimento e negou qualquer envolvimento com tortura de militantes. Jair teve o nome citado no dossiê Brasil Nunca Mais por militantes que afirmam ter sido torturados por ele. Porém, acompanhado de um advogado, ele negou a participação e disse que apenas datilografava os depoimentos dos presos. “Por que meu nome saiu como torturador? E como eu retiro meu nome de lá?”, questionou Jair.

Outro que prestou depoimento foi o advogado Jacob Lopes Máximo, que teria participado de um atentado no Show Medicina, em 1965, realizado no Instituto de Educação, em Belo Horizonte, quando uma ampola de ácido bromídrico foi jogada no palco e acertou pessoas na plateia. Jacob alegou que era um apoiador do ex-governador da Guanabara, Carlos Lacerda, e que o show era uma crítica ao político. Por isso, segundo ele, alguns o relacionaram ao atentado. Jacob negou participação.

Volta às salas de tortura

Na manhã dessa terça-feira, representantes da CNV e quatro militantes que foram torturados no 12º Batalhão de Infantaria (que até a década de 1970 era chamado de 12º Regimento de Infantaria) visitaram o local e fizeram um reconhecimento das salas e celas. “A CNV não processa nem julga e tem que fazer apuração criteriosa dos fatos, das circunstâncias e dos locais onde ocorreram as violações dos direitos humanos”, explicou o coordenador da CNV, Pedro Dallari.

O médico Carlos Valadares, que militou na Ação Popular (AP), reconheceu alguns locais de tortura e expressou, na saída, a sensação que teve: “É sentimento de que o Brasil está mudando. Quando estive aqui em julho de 1969, eu fui violentamente torturado”, recordou. O 12º BI é um dos sete locais das Forças Armadas usados para tortura. A CNV prepara um relatório com os detalhes dos locais, vítimas e torturadores, que deverão estar pronto em 10 de dezembro. Em 16 de dezembro, a CNV encerra as atividades. Além desse, um outro documento, com os centros clandestinos de tortura, também está sendo preparado.

 

 

Fonte – EM

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