Já está em curso na internet uma campanha para um abaixo-assinado pela mudança do nome do Mausoléu Castelo Branco, em Fortaleza. Se o movimento for bem-sucedido, o nome do cearense que comandou o primeiro governo militar, a partir de 1964, será substituído por Frei Tito – frade dominicano preso e torturado por agentes da repressão política na ditadura. Segundo o autor da proposta, o professor de literatura Marcio Seligman, da Unicamp, a mudança se destina a robustecer a “cultura democrática” no País.
Ações semelhantes devem ser reforçadas pelo Ministério Público Federal (MPF). Procuradores do Grupo de Trabalho Justiça de Transição pretendem recorrer à Justiça para conseguir mudanças. Trata-se, segundo integrantes do grupo, de preservar a memória e a verdade no País.
Os procuradores preparam-se nesse momento para recorrer contra decisão da Justiça Federal de vetar a mudança do nome de um dos principais cartões postais do Rio – a Ponte Costa e Silva, que liga a capital fluminense a Niterói e é mais conhecida como Ponte Rio-Niterói. Ao rejeitar a ação do MPF, a Justiça disse que iniciativa cabe ao Legislativo, e não ao Judiciário.
O Legislativo também participa do debate. A recomendação feita pela Comissão da Verdade, no relatório entregue à presidente Dilma Rousseff em dezembro, deu novo fôlego a um projeto de lei de autoria do deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), que também propõe a alteração do nome da Ponte Costa e Silva, o segundo presidente do período ditatorial. De acordo com o projeto, que tramita agora na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, ela passaria a se chamar Ponte Herbert de Souza, o Betinho, sociólogo que se destacou na defesa dos direitos humanos. “Quem praticou torturas e violações de direitos humanos não merece denominar nada neste País”, diz Alencar.
No interior do Rio, a Câmara Municipal de Volta Redonda decidiu, após uma audiência pública, trocar o nome de uma ponte que homenageava o terceiro presidente do período da ditadura, o general Emílio Garrastazu Médici. O logradouro, que liga Volta Redonda a Niterói, agora leva o nome d. Waldyr Calheiros, bispo da linha progressista da Igreja Católica que se opôs à ditadura.
Em Taquari, a cidade gaúcha onde nasceu Costa e Silva, seis dias após a divulgação do relatório o prefeito mandou retirar de praça pública um busto que homenageava o presidente militar. Ele também mudou o nome da área pública, agora denominada Praça da Democracia.
A ação foi questionada pelo Ministério Público, que viu nela o descumprimento da obrigação da municipalidade de proteger a memória. O prefeito, Emanuel Hassen, do PT, respondeu que a memória continua preservada, uma vez que o busto foi enviado ao museu local que reúne objetos pessoais do ex-presidente. Também foi enviada ao museu uma cópia do relatório da Comissão da Verdade. “Preservamos a história, mas não a homenagem”, disse Hassen.
Até agora o governo federal, a quem foi entregue o relatório, mostra-se cauteloso em relação ao assunto. Segundo a ministra Ideli Salvatti, da Secretaria de Direitos Humanos, as iniciativas devem partir de governos locais. “Quem define os nomes são quase sempre os Estados e os municípios”, observa.
No Estado do Ceará, o governador Camilo Santana (PT) também se mostra cautelosa em relação à mudança do nome do Mausoléu Castelo Branco. Embora o pai dele tenha sido preso e torturado por militares, por sua oposição à ditadura, o governador afirma que a alteração vai depender de debates públicos. “Isso me ainda mexe profundamente comigo”, diz ele, lembrando que tinha apenas sete anos quando ocorreu a prisão do pai. “Mas sou governador de todos os cearenses e pretendo fazer uma discussão aberta sobre o assunto, ouvindo todos os lados.”
Se o debate for mesmo adiante, o que não vai faltar são nomes para mudar. Na Região Norte do País, por exemplo, existem dois municípios que homenageiam o Presidente Médici, em cujo governo a repressão atingiu o ponto máximo de toda a ditadura, segundo historiadores: Presidente Médici, em Rondônia, e Medicilândia, no Pará.
Fonte – Estadão