No livro “Memórias de uma guerra suja”, ele fez revelações inéditas sobre a ditadura militar e admite vários assassinatos
Cláudio Guerra: cotado para depor na Comissão da VerdadeA Comissão da Verdade, oficialmente montada nesta quinta-feira pela presidenta Dilma Rousseff (PT), deve convidar ex-delegado do DOPS (Departamento de Ordem Político Social) do Espírito Santo, Cláudio Guerra, para prestar depoimento sobre envolvimento em crimes durante a ditadura militar.
No livro “Memórias de uma guerra suja”, dos jornalistas Rogério Medeiros e Marcelo Netto, Guerra faz várias revelações sobre o regime militar até então desconhecidas. Ele afirma que o delegado Sérgio Paranhos Fleury – titular da Delegacia de Investigações Criminais (DEIC) de São Paulo, considerado um símbolo da linha-dura do regime foi assassinado por um grupo de militares revoltados contra a abertura política no Brasil.
Em outros trechos do livro, Guerra também declara que militantes de esquerda foram incinerados em uma usina de cana de açúcar localizada no Rio de Janeiro e que os mesmos comandantes que planejaram o atentado do Riocentro foram os responsáveis pela execução do jornalista Alexandre Von Baumgarten, em 1982. Alguns personagens citados por Guerra, no entanto, desmentem trechos dos depoimentos do ex-delegado do DOPS e chegam a classifica-los como “fantasiosos”.
O advogado José Carlos Dias, conselheiro da Comissão de Justiça e Paz e um dos signatários da Carta aos Brasileiros, redigida em 1977, na faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), repudiando a Ditadura Militar, não teceu comentários sobre os relatos de Guerra. Mas ele afirmou ao iG que é importante o convite a Guerra. “Claro que ele pode ser chamado. Assim como outras pessoas”, afirmou Dias. “Temos que cumprir a lei que é procurar a verdade dos fatos e reconstituir a história da melhor forma possível”, disse.
O ex-procurador-geral de Justiça e que durante a juventude atuou como membro do grupo Ação Popular, Cláudio Fonteles, também defendeu o convite a Guerra como parte das investigações da Comissão da Verdade. “Ele pode ser ouvido, mas vamos esperar. Não somente ele, mas qualquer pessoa que venha (contribuir). Se você observar a lei que cria a Comissão da Verdade vai ver que ela tem atribuições de convidar pessoas, convocar, mas claro que sim (Guerra pode ser convocado). Porque ele revela fatos do período. Nossa missão é descobrir cada vez mais (fatos sobre a ditadura)”, declarou.
Já o escritor pernambucano José Cavalcanti Filho ressaltou que, nesse primeiro momento, “nada pode ser excluído”. “Todos podem ser chamados. Nesse caso pessoal, eu tenho um elemento adicional. É que Eduardo (Collier Filho – militante da Ação Popular Marxista Lenista) foi meu maior amigo de infância. Nós éramos as únicas pessoas de idade aproximada em um raio de um quilômetro (em Recife). Então eu fui o último amigo de Duda a vê-lo vivo e gostaria muito de poder contribuir, de saber mais ou menos o que aconteceu”, disse.
No livro “Memórias de uma guerra suja”, o ex-delegado do DOPS afirma que Eduardo Collier Filho e mais nove militares de esquerda foram supostamente incinerados em uma usina de açúcar. “Pode ser verdade, pode ser mentira. Com equilíbrio, com tranquilidade. Nós queremos apurar a verdade”, finalizou Filho.
A Comissão da Verdade será oficialmente instituída na próxima quarta-feira. Haverá uma primeira reunião de trabalho para definir detalhes operacionais da entidade. Também devem ser definidos os primeiros passos da investigação sobre os atos contra os direitos humanos cometidos durante o regime militar. A Comissão da Verdade tem dois anos para apresentar um relatório com o resultado das investigações. Ela não tem poder de polícia, nem punitivo. A intenção dela é, na visão dos seus membros, “fechar feridas” ainda abertas pela ditatura militar.
Fonte – IG