São ex-advogados de presos políticos, como José Carlos Dias e Rosa Maria Cunha, militantes de Direitos Humanos, como Paulo Sérgio Pinheiro e Maria Rita Kehl, e juristas de ponta, como Gilson Dibb, Cláudio Fontelles e José Paulo Cavalcanti Filho. Parciais? Sim, sem dúvida. Todos têm lado -o mesmo lado, apesar de uns mais tucanos, outros mais petistas- e posições claras e bem conhecidas. Mas não há ali xiitas, nem juvenis, e nenhum está tecnicamente impedido pela lei que criou a comissão. Não há torturados ou parentes de desaparecidos. Perdida mais essa guerra, os militares agora alimentam uma dúvida (ou seria certeza?): para que vai servir mesmo a Comissão da Verdade? Eles estão convencidos de que as histórias de torturas, mortes e desaparecimentos já são amplamente conhecidas. Tanto quanto as vítimas e os próprios algozes. Logo, desconfiam, ou sabem, que a comissão é a cortina de fumaça para produzir ações penais contra os agentes do Estado que exorbitaram durante a ditadura. Ou seja, contra os militares da época.Será, simultaneamente, o canal para catequizar a população para a tese de que, mais de 30 anos depois, já passou da hora de revogar a Lei da Anistia para processar e punir torturadores. Até porque tortura é crime imprescritível. Uns com raiva, outros com melancolia, esses militares alegam que todas as verdades sempre têm dois ou mais lados. Mas, na história, quem ri por último ri melhor e a verdade é sempre a do vencedor. No caso, de quem subiu a rampa do Planalto pela força do voto.
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Editorial do jornal O Estado de S.Paulo. Os sete nomes escolhidos pela presidente Dilma para integrar a Comissão da Verdade, a discrição com que ela conduziu o processo de escolha ao longo de seis meses e o seu empenho em deixar patente que o colegiado é um órgão de Estado e não de um governo configuram um cenário de maturidade para os trabalhos do grupo. A comissão será empossada na presença dos ex-presidentes Sarney, Collor, FH e Lula. A própria criação do organismo, por meio de lei aprovada em outubro do ano passado, obedeceu à preocupação do Planalto de conciliar a apuração das violações dos direitos humanos sob o regime militar com a garantia de que os fatos eventualmente esclarecidos representarão o fim de uma trajetória – e não o ponto de partida para um acerto de contas com os perpetradores que vierem a ser identificados. Tanto assim que o período a ser abarcado pela pesquisa começa 18 anos antes do golpe que deu origem à ditadura dos generais e termina 3 anos depois do restabelecimento do poder civil no País, quando entrou em vigor a atual Constituição. Além disso, a lei excluiu da comissão ocupantes de cargos executivos em partidos políticos ou de comissão em quaisquer ramos do Poder público, bem como quem quer que não tenha condições de atuar com imparcialidade. Provocando protestos de organizações de defesa dos direitos humanos e de ativistas, ficou também estabelecido que ninguém será obrigado a depor perante a comissão nos dois anos em que funcionar. Ainda assim, oficiais da reserva das Forças Armadas tentaram desqualificar a iniciativa da presidente, prevista, aliás, no Programa Nacional de Direitos Humanos, assinado pelo então presidente Lula em dezembro de 2009. Eles atacaram Dilma por não ter demonstrado “desacordo” com as suas ministras que deram declarações condenando a ditadura e acusaram a comissão de “revanchismo” por não prever a inclusão de representantes da caserna – como se devesse ser uma espécie de órgão paritário. Os agentes do regime militar que aceitarem falar à comissão e entregar-lhe documentos pertinentes que estejam em seu poder terão, de todo modo, ampla oportunidade de dar a sua versão dos fatos que, a esta altura, pertencem à história. Seja lá o que tiverem feito durante os “anos de chumbo”, não poderão ser processados, devido à Lei de Anistia, promulgada em agosto de 1979 e endossada pelo STF, por 7 votos a 2, em abril de 2010. A julgar por seus integrantes, a comissão deverá se pautar pelo equilíbrio e o tratamento criterioso das evidências que encontrar nos arquivos oficiais, embora as suas pesquisas devam reabrir feridas quem sabe já cicatrizadas entre os familiares dos torturados, mortos e desaparecidos – e perturbar pessoas próximas daqueles que cuidaram de manter em segredo o que faziam nos porões da repressão.
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Editorial do Correio Braziliense. Agiu bem a presidente da República ao cercar-se de cuidados no encaminhamento da Comissão da Verdade. Tanto na negociação com os partidos políticos que criaram o órgão quanto na sua implantação, Dilma empenhou-se em caracterizar a iniciativa como de Estado, não de governo. A escolha recaiu sobre pessoas qualificadas, de ilibada reputação, ao que tudo indica isentas de pressões políticas. José Carlos Dias, Gilson Dipp, Rosa Maria Cardoso da Cunha, Cláudio Fonteles, Paulo Sérgio Pinheiro, Maria Rita Kehl e José Paulo Cavalcanti Filho tomarão posse em cerimônia para a qual foram convidados os ex-presidentes. A tarefa que desafia os sete profissionais é árdua. Em dois anos, eles terão de investigar 42 anos de violação de direitos humanos em todo o território nacional. É possível que se debrucem com mais atenção sobre o período mais recente. Mesmo assim, não será peleja fácil. De um lado, muitos envolvidos morreram. De outro, arquivos sumiram. Há, também, resistências à própria comissão e ao processo de implantá-la. Grupos militares temem “revanchismos” e o risco de o trabalho conduzir à revisão da Lei da Anistia. Familiares de presos e desaparecidos políticos queriam pessoas mais comprometidas com a luta contra a ditadura. A sociedade espera que a comissão investigue os subterrâneos da ditadura e, no relatório, apresente amplo painel da história brasileira para que o país se encontre com a verdade ou as verdades — encontro necessário à consolidação da democracia. Como disse a presidente Dilma, “o silêncio e o esquecimento são sempre grande ameaça. Não podemos deixar que a verdade se corrompa com o silêncio”. Conhecer o passado tem essa função civilizatória. Só tem medo da verdade quem se esconde na escuridão da ignorância. Não é o caso das Forças Armadas. A instituição não tem o que temer. Perde o sono quem praticou prisões ilegais, torturas, homicídios, execuções sumárias, ocultação de cadáveres.