Ministério do Exército abrigou tortura na ditadura, diz ex-aluno da UnB

Distante pouco mais de 500 metros do Palácio do Planalto, o Ministério do Exército foi utilizado como centro de detenção e de tortura durante a ditadura militar. A revelação é do ex-aluno da Universidade de Brasília (UnB) Hélio Doyle, que prestou depoimento nesta sexta-feira à Comissão da Memória e Verdade da UnB, com o também ex-aluno Álvaro Lins. Ambos participaram do movimento estudantil nos anos 1960 e 1970.

“Fui preso duas vezes e levado para a Polícia Federal e de lá encaminhado ao Setor Militar Urbano (SMU) onde funcionava o Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi). Em outra prisão fui levado para o Ministério do Exército e me colocaram em uma sala com isolamento acústico. Eles tinham me levado com outros militantes. O erro foi que eles não nos encapuzaram e eu pude saber exatamente onde eu estava. Um sintoma de que o lugar era usado para interrogar e torturar os militantes políticos é que você tinha ali salas com isolamento”, disse Doyle, formado em jornalismo pela UnB e que integrava a Ala Vermelha, dissidência do Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

Doyle, que também integra a Comissão da Verdade dos Jornalistas do Distrito Federal, relatou que os ministérios do Exército e da Marinha foram identificados como centro de detenção por outros colegas de profissão que também foram presos e que ouvidos pela comissão. “Nós colhemos depoimentos de três jornalistas que também disseram que foram levados para a Esplanada e que ficaram na garagem do Ministério da Marinha”, disse. Um deles, Romário Schetino já foi ouvido pela comissão.

Álvaro Lins contou à Comissão da Verdade que sofreu perseguição da reitoria por sua militância no movimento estudantil, especialmente do ex-reitor da UnB, José Carlos de Almeida Azevedo. Reconhecido como liderança estudantil, Álvaro, foi preso duas vezes entre 1968 – ano em que entrou na universidade para fazer o curso de Física – e 1969, quando foi jubilado. “O Azevedo, reitor da época, forçou meu jubilamento. Eu estava preso quando houve a prova de recuperação e o Azevedo não aceitou essa justificativa para que eu fizesse a prova em outro momento”, diz. Álvaro não concluiu o curso de graduação. Azevedo, que também era Capitão de Mar e Guerra da Marinha, foi responsável pela exclusão de 56 estudantes da Universidade.

“Com o AI-5 (Ato Institucional nº 5) e após a segunda prisão, tinha três possibilidades, abandonar a política, ir para o exterior e a clandestinidade. Pouco tempo depois saí de casa e entrei para a clandestinidade com o nome de Paulo Rodrigues Sampaio, passei dois anos em São Paulo e depois fui para o Rio de Janeiro com outro nome. Trabalhei em fábricas como operário para articular o movimento sindical. Permaneci na clandestinidade até 1980”, disse.

 

Desaparecidos da ditadura

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Os ex-alunos também falaram sobre episódios como a prisão de um policial infiltrado entre os alunos da UnB e a convivência com Honestino Guimarães, liderança estudantil e ex-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE). Em 1968, os alunos protestavam contra a morte do estudante secundarista Edson Luis de Lima Souto, assassinado por policiais militares no Rio de Janeiro. Durante os protestos, os estudantes prenderam Edrovando Guimarães Gutierres, policial infiltrado, que recebeu o apelido de Pera Dourada. A polícia cercou a UnB exigindo a libertação de Pera Dourada. Os estudantes propuseram trocar o espião pelos colegas presos. O policial foi devolvido e os universitários libertados em frente à reitoria.

Após esse episódio, o Exército invadiu a UnB para prender oito estudantes. Somente Honestino Guimarães foi preso, permanecendo na cadeia até novembro. Em setembro, o Conselho Diretor da UnB o expulsou da universidade. Ele entrou para a clandestinidade e desapareceu, após ter sido preso em 1973.

“O Honestino era uma grande referência para a gente, depois que ele entrou para a clandestinidade ainda nos encontramos algumas vezes, mas depois perdi o seu rastro”, disse Lins. Em 1996, após 23 anos do seu desaparecimento, o governo reconheceu oficialmente que Honestino era, de fato, um dos mortos da ditadura.

 

 

Fonte – Agência Brasil

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