Exílio ou silêncio

Fórum das Letras recebe escritores que são perseguidos políticos

 

Na rua. Um cortejo marcou a abertura do Fórum das Letras de Ouro Preto na quarta-feira

 

Ser expulso de seu próprio país por causa de versos escritos em pedaços de papel e publicados em blogs é impensável para o brasileiro hoje. Apesar dos incontáveis problemas políticos, escândalos de corrupção e acusações que beiram o racismo trocadas por políticos poderosos – e cidadãos comuns – em redes sociais, a verdade é que gozamos do pleno direito à liberdade de expressão. Mas, infelizmente, essa não é a realidade vivida em todo o mundo. Em muitos países, um trecho de poema pode levar à perseguição política, à prisão ou ao exílio.

Esse foi o caso dos poetas Julia Oliveira e Mohsen Emadi, de Honduras e do Irã, respectivamente, que falaram sobre suas histórias e escritos no debate “Exílio ou silêncio?”, que teve comentário de Frei Betto em sua abertura, anteontem, no Fórum das Letras, em Ouro Preto. Julia virou um alvo em Honduras por escrever contra o regime e só agora, dois anos após sair de seu país, sente que pode começar a usar seu nome real, Diana Vallejo. “Precisamos entender que a liberdade de expressão, de que tanto gostamos, está sujeita a planos econômicos. E temos que trabalhar para que isso mude”. A hondurenha foi acolhida pela Rede Internacional de Cidades de Refugiados (Icorn, na sigla em inglês), que também recebeu o poeta iraniano.

Escrevendo desde os 16 anos, Emadi é um escritor premiado em seu país. Em 2009, o regime conservador de Mahmoud Ahmadinejad assumiu o poder, e ele passou dois meses protestando nas ruas do Irã. Correndo o risco de ser preso, procurou a Icorn. Depois de passar por Finlândia, República Tcheca e Espanha, ele atualmente mora na Cidade do México. Durante a conversa, Emadi contou sobre a saudade de escutar os sons de sua própria língua quando se vive em um país tão distante do seu, e declamou, usando a cadência quase cantada do persa, uma tradução que fez do poema “No Meio do Caminho Tinha uma Pedra”, de Carlos Drummond de Andrade.

O debate ainda contou com a presença da poetisa mexicana María Tereza Atrián e do escritor brasileiro e presidente do PEN Club do Brasil – rede internacional de promoção da literatura e liberdade de expressão –, Cláudio Aguiar, e foi mediado pela francesa Sylvie Debs, representante da Icorn no Brasil.

“O México é paradoxal”, declarou María Tereza. “Temos essa tradição de receber exilados, mas temos desaparecidos políticos. Vivemos um ciclo viciado de mentira e verdade”, disse a poeta, que começou sua fala com uma declaração de repúdio sobre o desaparecimento de 43 estudantes mexicanos. “Vivos estavam, e vivos os queremos”.

Inspirados pela história desses e outros escritores exilados, o reitor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Marcone de Freitas, a idealizadora e coordenadora do Fórum das Letras, Guiomar de Grammont; o diretor da Icorn, Helge Lunde, o presidente do PEN Clube do Brasil, Cláudio Aguiar, e a representante do Icorn no Brasil, Sylvie Debs, assinaram no primeiro dia do Fórum uma carta de intenção para a criação da primeira Casa Brasileira de Refúgio (Cabra).

A iniciativa é inédita na América do Sul. A partir de 2015, ela oferecerá uma residência de quatro meses (o objetivo é de estendê-la para dois anos) em Ouro Preto a escritores perseguidos. O projeto prevê que os escritores recebidos deem cursos na Ufop durante sua estadia na Cabra. Sylvie, que está à frente da criação da casa, conta que já há conversas com instituições de Porto Alegre, Belo Horizonte e São Paulo para multiplicar a experiência.

 

Política. A transformação do Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) em lei foi o principal foco de um outro debate ocorrido anteontem no Fórum das Letras, em Ouro Preto. A discussão acalorada contou com intervenções enérgicas do público e terminou com o compromisso de Suzete Nunes, coordenadora geral de Literatura e Economia do Livro do Ministério da Cultura (MinC), de levar até o fim do ano um projeto de lei ao Congresso.

 

Confira. A programação do Fórum das Letras prossegue e está no site forumdasletras.ufop.br

 

 

Fonte – O Tempo

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