Publicado originalmente em: 22/09/2020 19h35
A União Federal foi condenada a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 100 mil à viúva de um anistiado político que, em 1985, foi demitido da General Motors do Brasil Ltda. devido a sua participação em um movimento grevista. A sentença, do dia 17/9, foi proferida pelo juiz federal Renato Barth Pires, da 3ª Vara Federal de São José dos Campos/SP.
Segundo a autora, o seu marido ingressou na empresa em dezembro de 1977, na função de montador de carros. Afirma que ele foi demitido em razão de sua adesão, em abril de 1985, ao movimento grevista que mobilizou cerca de 36 mil metalúrgicos na região do Vale do Paraíba. Ela alega que a demissão por justa causa teve caráter essencialmente político, uma vez que a GM dispensou arbitrariamente 93 funcionários como resposta à ocupação da empresa pelos grevistas.
Conforme relatado pela autora, à época, muitos trabalhadores foram demitidos com o apoio do Estado, que comandava o regime de exceção. Sustentou que as empresas agiam em conluio com o órgão de repressão, o qual perseguiu o seu marido politicamente por anos e coagiu empregadores a não contratarem pessoas dispensadas durante as greves. Afirmou que o registro funcional de seu cônjuge foi enviado pela empresa ao Estado e que a simples participação indireta na greve ensejava a dispensa.
Em sua contestação, a União afirmou que a autora já recebe prestação continuada do governo federal a título de reparação econômica, além de um montante que foi pago por ocasião da concessão da anistia. Sustentou não ser possível a cumulação de quaisquer pagamentos e benefícios com danos morais e materiais. Afirmou, ainda, não haver comprovação da conduta lesiva, do dano e do nexo de causalidade.
Na decisão, Renato Barth Pires ressalta que, conforme documentos juntados aos autos, naquele período as indústrias da região teriam constituído um centro comunitário de segurança no Vale do Paraíba onde eram realizadas reuniões com integrantes de órgãos de informações do Estado. A finalidade dessas reuniões, segundo consta, era trocar informações sobre segurança patrimonial e industrial, que serviram para evitar a contratação de ativistas do movimento sindical.
Para o juiz, ficou evidente que a demissão do cônjuge da autora ocorreu devido a questões meramente políticas, causando efetivo abalo psíquico e significativo constrangimento. A sentença considerou ter sido comprovado o nexo causal entre a conduta da União e o resultado lesivo, cabendo o dever de indenizar.
“Não restam dúvidas, à vista do conjunto probatório, que o marido da autora experimentou graves dissabores, que decorreram não apenas da perda de seu emprego, de alto prestígio social, mas também da disseminação pública desse fato, inclusive por meio da imprensa, o que com certeza dificultou a recolocação do autor no mercado de trabalho. Tais condutas ultrapassam a linha do simples aborrecimento, mas se constituem em verdadeiros danos morais indenizáveis”, pontuou o magistrado.
Quanto ao valor da indenização, Renato Barth considera que a reparação deve atender a uma dupla finalidade: minimizar as ofensas sofridas pela parte autora e, ao mesmo tempo, causar ao ofensor dano suficiente para impedir que violações semelhantes voltem a ocorrer. “Ademais, o valor da indenização deve ser fixado com alguma dose de razoabilidade, quer para que não seja ínfima, quer para que não cause um enriquecimento sem causa do ofendido”, diz o juiz.
Em casos semelhantes, a jurisprudência do TRF3 tem arbitrado o valor da indenização em R$ 100 mil, quantia considerada suficiente pelo juiz para alcançar as finalidades citadas. (JSM)
Processo no 5002888-55.2020.4.03.6103
Fonte – Justiça Federal