Jovem araraquarense é símbolo de luta durante a ditadura

A enfermeira Luísa Augusta Garlippe tinha 33 anos quando foi morta na região do Araguaia

A jovem araraquarense Luísa Augusta Garlippe, a Tuta, se tornou símbolo de resistência e luta durante os anos da ditadura militar. Ela era jovem e saiu de Araraquara na década de 60 para estudar enfermagem na capital, lá se uniu ao combate à ditadura militar e às ideias comunistas, foi para a guerrilha do Araguaia e desapareceu. Relatos dão conta que morreu em junho de 1974, aos 33 anos.

Luísa fez parte de uma geração onde discordar era crime. “Ela trabalhava na área da saúde, era parteira, foi para o Araguaia ajudar a população muito carente, não foi pegar em armas. Mas acabou morta porque tinha uma ideologia de mundo diferente”, diz o fisioterapeuta Luiz Armando Garlippe, sobrinho de Luíza.

Luísa (no meio de amigos) logo quando foi para São Paulo estudar enfermagem

Luísa (no meio de amigos) logo quando foi para São Paulo estudar enfermagem

História 
Tuta nasceu em Araraquara em 16 de outubro de 1941. Filha do ferroviário Armando Garlippe e da dona-de-casa Durvalina Santomo Garlippe, teve mais um irmão da mesma mãe, Saulo Garlippe. Aos 10 anos perdeu a mãe e seu pai se casou novamente, tendo mais quatro filhos: Adilson, Armando, Marli e Maray, todos foram criados em Araraquara.

A garota estudou na escola Pedro José Neto e no Ieba (Instituto de Ensino Bento de Abreu) e aos 19 anos decidiu ir para a capital para estudar enfermagem. Tinha sido aprovada no curso da Universidade do Estado de São Paulo (USP). Em 1964, quando se formou foi trabalhar no Hospital das Clínicas e chegou a ser enfermeira-chefe do Departamento de Doenças Tropicais, assunto em que se especializou, fazendo inclusive, na época, algumas viagens ao Amapá e ao Acre.

O sobrinho conta que nesta época seu tio Saulo também se mudou para a capital para estudar engenharia e Tuta já fazia militância no PCdoB, onde seu apelido era Tuca. A jovem participava também da Associação dos Funcionários do Hospital das Clínicas, distribuía panfletos e organizava seus colegas de trabalho.

Luísa (a quinta da esquerda para direita) já na equipe do Hospital das Clínicas

Luísa (a quinta da esquerda para direita) já na equipe do Hospital das Clínicas

Araguaia 
Numa profissão considerada estratégica, com seu companheiro Pedro Alexandrino Filho, também conhecido como Peri, Tuta se mudou para a região do Araguaia. “No Araguaia, minha tia trabalhava na área da saúde era parteira e sabemos que depois da morte de um médico, assumiu a chefia dos serviços lá na região”, conta Luiz Armando.

Antes de embarcar para o Araguaia, em 1971, Tuta se encontrou com o irmão Saulo e disse que faria uma viagem, mas sem dar detalhes do que faria, por segurança dela e também da família.

Foram anos sem notícias de Luísa, até que no final de 1974, Saulo teria sido procurado por um dos militantes do partido que relatou a morte de Tuta.

Luísa Augusta Garlippe é a araraquarense morta durante a ditadura militar

Luísa Augusta Garlippe é a araraquarense morta durante a ditadura militar

Morte 
Segundo relatório da Comissão da Verdade feito em 2013, Luísa foi vista pela última vez por seus companheiros em 25 de dezembro de 1973, em um acampamento próximo à Serra das Andorinhas, quando houve intenso tiroteio contra eles.

Em entrevista dada à Revista Playboy, em dezembro de 2006, o tenente-coronel Sebastião Rodrigues de Moura, o major Curió, afirmou ter assassinado as guerrilheiras Luísa Augusta Garlippe e Dinalva Teixeira. Na matéria Curió diz que Tuta e Dina tentavam ir embora e estavam vendendo algumas coisas para financiar a fuga. Então, o major armou uma emboscada e acabou atirando em Dina, que tinha 29 anos. Tuta, segundo Curió foi morta por um tenente. A ação teria ocorrido em junho de 1974, na região de Marabá. Segundo o major, ambas foram as últimas militantes a tombar na guerrilha.

Já segundo Raimundo Antônio Pereira de Melo, presidente da Associação dos ex-combatentes da Guerrilha do Araguaia, Luísa Augusta Garlippe e sua amiga Dina caíram em uma emboscada quando pediram ajuda para um vaqueiro de uma fazenda da região para comprar roupas e as passagens. O mesmo foi até o quartel para delatar o paradeiro delas e ambas acabaram aprisionadas.

Foram levadas para a casa azul onde eram feitas as torturas. No mesmo dia teria sido levadas para a mata, onde estavam outras pessoas desaparecidas. Até agosto de 1975 Tuta teria sido vista, mas depois desta data tudo leva a crer que a jovem foi morta na mata e jogada no rio.

“As informações sobre sua morte são desencontradas. Até hoje a família não tem resposta, mas estamos aqui para não deixar sua história ser esquecida”, diz o sobrinho Luiz Armando.

Em 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o Brasil pela desaparecimento de 62 pessoas na região do Araguaia no caso Gomes Lund e Outros (“Guerrilha do Araguaia”) VS. Brasil, dentre elas está Luísa. A sentença obriga o Estado Brasileiro a investigar os fatos, julgar e, se for o caso, punir os responsáveis e de determinar o paradeiro das vítimas.

Luísa consta na lista de desaparecidos políticos do anexo I da lei 9.140/95. Na CEMDP, o caso de Luísa foi protocolado com o número 058/96.

Em sua homenagem a cidade de Campinas deu o seu nome a uma rua no bairro Vila Esperança. O PROCON da cidade de Santo André leva seu nome e em Araraquara, a homenagem foi na Comissão de Direitos Humanos.

O que foi a guerrilha do Araguaia 
A guerrilha do Araguaia foi um movimento guerrilheiro existente na região amazônica brasileira, ao longo do rio Araguaia, entre as décadas de 60 e 70. Criada pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), o objetivo da ação era fomentar uma revolução socialista iniciada no campo.

Combatida pelas Forças Armadas a partir de 1972, quando vários de seus integrantes já haviam se estabelecido na região há pelo menos seis anos, o palco das operações de combate entre a guerrilha e os militares se deu onde os estados de Goiás, Pará e Maranhão faziam divisa. Seu nome vem do fato de se localizar às margens do rio Araguaia, próximo às cidades de São Geraldo do Araguaia e Marabá no Pará e de Xambioá, no norte de Goiás.

Estima-se que o movimento era composto por cerca de oitenta guerrilheiros sendo que, destes, menos de vinte sobreviveram. Muitos militantes da guerrilha seguem desaparecidos até hoje.

Fonte – acidadeon.com