Publicado originalmente em 23.out.2019 às 16h43
Jornalista relatou de queda de meteorito à morte de PC Farias, mas médium era seu tema favorito
Ele gostava de se definir como repórter investigativo, profissão que abraçou há 63 anos. Mas nas últimas décadas se tornou o “repórter do Chico”, em alusão à proximidade que manteve com o médium mineiro Chico Xavier (1910-2002).
Saulo Gomes fez coberturas de queda de meteoritos, da seleção brasileira após a conquista da Copa do Mundo de 1958 e de casos como as mortes dos integrantes do grupo Mamonas Assassinas e de PC Farias, mas eram as passagens envolvendo Chico as que mais gostava de falar.
Como quando convenceu o líder espírita, em 1968, a romper silêncio de 24 anos com a imprensa. Desde 1944 ele não concedia entrevistas, após repercussão de reportagem de Davi Nasser e Jean Manzon que questionou sua mediunidade em “O Cruzeiro”.
“Foi por meio do Saulo que tive a primeira manifestação de ser jornalista, ao ler uma entrevista na extinta Revista do Rádio, em 1957. Li ele contar uma passagem num voo que tinha problemas e poderia cair. Ele pegou o gravador, um trambolho, ligou na tomada do avião e começou a entrevistar os passageiros. O avião não caiu e ele teve uma bela reportagem”, disse o amigo Moacyr Castro, 70.
Desde 2009, Saulo publicou em livros histórias do médium, de quem virou amigo naquele 1968, em uma trilogia.
No mais recente deles, “Nosso Chico” (Intervidas, 2018), que celebrou 50 anos do primeiro encontro com Chico, contou que o líder espírita poderia ter sido fazendeiro, quando, nos anos 1970, ganhou uma propriedade em Goiás de uma frequentadora de sua entidade em Uberaba (MG). Mas destinou o imóvel para ações sociais, como fazia com os presentes que recebia.
Sempre guardava tudo ligado às reportagens que fazia e, com Chico, amealhou documentos e bilhetes que manteve de forma reservada até a publicação no livro.
“Poucas vezes um repórter tem chance de comemorar bodas de ouro de uma reportagem”, disse ele a este jornalista, ao celebrar seu objetivo de entrevistar Chico.
Antes, lançara “Pinga-Fogo” (2009), que reproduz uma entrevista de 1971 ao programa homônimo da TV Tupi, e “As Mães de Chico Xavier” (2011).
Natural do Rio, viveu em São Paulo, São José do Rio Preto, Cuiabá e Montevidéu, exilado na capital uruguaia por sete meses durante a ditadura.
Morava em Ribeirão Preto (SP) desde 2002, onde ocupava a cadeira 28 da Academia Ribeirão-pretana de Letras e era membro da Ordem dos Velhos Jornalistas.
Vice-presidente da Abap (Associação Brasileira de Anistiados Políticos), dizia que tinha como segredo para manter a mente acesa ler “o dia inteiro”. “Sobre tudo quanto é assunto”, repetia.
Sempre que questionado se era espírita devido à ligação com Chico, Saulo dizia ser “repórter”. Um infarto o matou na madrugada desta quarta-feira (23), em seu apartamento, no centro de Ribeirão, onde vivia com a mulher, Edna. O corpo será velado na Câmara Municipal.
Fonte – Folha de S.Paulo