A essência da ditadura: o esquecimento e a impunidade

‘Memórias de uma guerra suja’ de Rogério Medeiros, que deveria mais propriamente ser chamado de ‘Memórias dos crimes do Estado Brasileiro’, é um livro impressionante com revelações históricas assustadoras.

Mas, com a imposta Lei de Anistia, a ditadura se blindou, exigindo a permanência de sua essência, a impunidade, para que seus crimes, e o maior deles, origem de todos os demais – a derrubada de um governo eleito pelo povo, com a Constituição de 1946 rasgada, vilipendiada, sob a orientação e sustentação política e econômica, já comprovada, dos impatrióticos interesses do império ianque – fossem intocados e esquecidos, como bem o disse o último milico ditador general Figueredo, ao sair pela porta dos fundos da História: “Esqueçam-se de mim”. Ou seja, esqueçam de minha quadrilha, dos crimes hediondos que ela cometeu contra as liberdades e o desenvolvimento do povo brasileiro.

A impunidade é o esquecimento, pois no esquecimento a impunidade se mantém e se alimenta. E hoje, nesta democracia domesticada, temos revelações assustadoras, e apesar de a nossa Constituição proibir a pena de morte, ela existe e se mantém, institucionalmente velada, contra o povo pobre favelado, mulatos, negros e nordestinos.

Esta semana começou com esta notícia:

Policiais militares de uma equipe das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota) foram presos em flagrante pela Corregedoria da Polícia Militar e pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), da Polícia Civil, após uma testemunha relatar a execução na ação que terminou com seis mortos na Zona Leste de São Paulo na segunda-feira (28).

A informação foi confirmada nesta terça-feira (29) pelo delegado-geral da Polícia Civil, Marcos Carneiro Lima, e pela assessoria de imprensa da Secretaria da Segurança Pública no estado de SP (SSP). O número de policiais detidos não foi informado.

Os seis suspeitos morreram após uma pretensa troca de tiros com a Rota no estacionamento ao lado de um bar, na Rua Osvaldo Sobreira, na Penha, na noite de segunda. Quatorze pessoas estariam reunidas.

Os PMs alegaram inicialmente aos seus superiores que todos os seis suspeitos haviam sido mortos em uma troca de tiros. O homem que teria sido executado pelos policiais teria sido detido ainda com vida no estacionamento onde estava com mais um homem e duas mulheres que sobreviveram ao suposto tiroteio. Outros cinco pessoas conseguiram fugir num carro, segundo dizem os policiais.

Uma testemunha

Mas, o que a PM não contava é que uma testemunha, uma mulher, gravou tudo pelo telefone celular e entregou as provas ontem à Polícia Civil. Pior: as provas mostram que os policiais eliminaram um dos suspeitos à chegada e balearam e torturaram as demais no Parque Ecológio do Tietê, recolocando-as três horas depois no posto, na cena inicial do pseudo confronto.

A testemunha telefonou no mesmo dia para o número 190 do Centro de Operações da Polícia Militar (Copom) para dizer que viu policiais da Rota pegarem um dos suspeitos vivo e o levarem para a região do Parque Ecológico do Tietê, também na Zona Leste, onde o teriam torturado e matado a tiros. Depois, segundo a testemunha, levaram o corpo de volta para o local onde teria ocorrido a troca de tiros, na Penha.

Luz vermelha na política de segurança

A luz verde concedida à ROTA pelos sucessivos governos tucanos – de José Serra em 2007-10 e de Alckmin, três vezes governador – constitui-se já, a esta altura, em um alerta vermelho para toda a sociedade paulista. É preciso mudar, alterar profundamente a política de segurança, até porque o crescimento da violência atestado a cada balanço mensal divulgado, atesta sua completa falência.

Ao colocar a ROTA em uma ação normal nas ruas, o governo Alckmin copia um dos piores exemplos em termos de política de segurança já vistos em São Paulo. Reedita a política de repressão, pura e simples da extrema direita já vista no Estado quando do governo biônico de Paulo Maluf entre os anos de 1979 a 1982, quando nos aproximávamos do final da ditadura.

E assim, com o PSDB, os crimes se realizam exatamente como na ditadura.

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