Presidente prefere ficar em silêncio

Logo de manhã, antes de deixar o Brasil rumo ao México, onde participa de reunião do G-20, a presidente Dilma Rousseff leu a reportagem do Correio/Estado de Minas sobre a tortura por ela sofrida em Juiz de Fora (MG), em 1972, mas preferiu o silêncio. Entre setores do governo e da sociedade civil, entretanto, os relatos contundentes da mandatária do país foram motivo de muita repercussão. Secretário nacional de Justiça e presidente da Comissão de Anistia do Ministério de Justiça, Paulo Abrão destacou a importância de testemunhos como o de Dilma ao Conselho Estadual de Indenização às Vítimas de Tortura. “Eles são fundamentais para desconstruir as verdades produzidas pela ditadura”, disse ele.

“A riqueza do testemunho de Dilma Rousseff na comissão estadual é recorrente nesses quase 11 anos de julgamentos. Esse caso ajuda a divulgarmos para a sociedade a importância do arquivo das vítimas”, afirmou Abrão. A divulgação das torturas sofridas pela presidente em Juiz de Fora (MG) reacendeu, na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seção Minas Gerais, o debate encerrado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou a anistia ampla, para os dois lados — agentes do Estado e atores da resistência. “Nós, da OAB, continuamos a entender que a Lei da Anistia não prospera diante da uma situação fática do crime da tortura. Temos de continuar a exigir punição”, disse Luís Cláudio Chaves, presidente da OAB-MG.

No mesmo coro, o presidente da OAB no Rio de Janeiro, Wadih Damous, lembrou a importância da Comissão da Verdade, que pretende esclarecer violações de direitos humanos ocorridas no período da ditadura. “O fato de a presidente ter sido torturada em Juiz de Fora era desconhecido de todos, o que mostra a amplitude e a responsabilidade dos trabalhos que a Comissão da Verdade terá que desenvolver”, afirmou Wadih. Ele se disse impressionado com a contundência do depoimento de Dilma reproduzido pela reportagem. “É muito difícil conter a indignação diante do relato da presidente Dilma, em que ela descreve os seus padecimentos sob tortura. São sofrimentos extraordinários que não encontram paralelo no cotidiano das nossas vidas.”

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) ressaltou que o episódio de tortura sofrido por Dilma, até então inédito, pode vir a integrar a agenda de trabalho da Comissão da Verdade. “A partir do depoimento dela, a comissão pode investigar a fundo o que ocorreu, existência de outras vítimas”, ressaltou o parlamentar. Para o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), conhecer mais um relato de tortura sofrida pela presidente da República colabora para a conscientização da sociedade, especialmente no momento em que a Comissão da Verdade começou a funcionar. “Todas essas histórias servem para as pessoas saberem a verdade, os fatos ocorridos, para que eles nunca mais se repitam”, destacou o petista.
Márcio Santiago, coordenador executivo da Comissão Estadual de Indenização às Vítimas de Tortura de Minas Gerais, ressaltou ontem a coragem de pessoas como Dilma, de reviverem momentos dolorosos. “São depoimentos que servirão para a história. Essas pessoas que superam a dor e contam o que viveram contribuem para a história de todos e a história do Brasil naqueles anos tão difíceis”, considerou Santiago. Paulo Abrão tem opinião semelhante, destacando os relatos como peças fundamentais na apuração da verdade. “Só a análise combinada entre esses arquivos das vítimas e os arquivos da repressão, que estão no Arquivo Nacional, pode, de fato, elucidar o que ocorreu no país naqueles anos de exceção”, assinalou.

Do total de 60 mil processos julgados, entre os 70 mil recebidos pela Comissão da Anistia desde 28 de agosto de 2001, quando foi instalada, um terço resultou em reparação moral às vítimas, com pedido formal de desculpas do Estado. Em outros 20 mil processos, os cidadãos que sofreram não apenas graves violações de direitos humanos — tortura, execução sumária, massacre, genocídio e desaparecimento forçado — como também violações do tipo monitoramento ilícito, demissões arbitrárias, compelimento ao exílio, entre outras, tiveram reconhecido o direito a indenizações no valor máximo de R$ 100 mil, que, juntas, somam R$ 2,4 bilhões.

 

 

Fonte – Correio Braziliense

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